O manejo do Cacau Nativo pelos extrativistas que habitam as margens do rio Purus, em Boca do Acre AM, adquire grande importância, na medida em que contribui para a geração de trabalho e renda na região e, por conseguinte, para a melhoria das condições sociais desses pequenos produtores. O manejo do cacau promove o uso sustentável da diversidade biológica existente no ecossistema florestal da Amazônia, uso este, por sua vez, que se apresenta como uma saída para a manutenção da floresta.
quarta-feira, 29 de março de 2017
segunda-feira, 13 de março de 2017
Terceiro Setor não é problema, é solução
* Ecio Rodrigues
Vez ou
outra a mídia nacional descobre que existem organizações da sociedade civil e
que essas entidades são constituídas por gente preocupada em educar crianças, cuidar
de doentes, conservar o meio ambiente. Tudo muito bonito.
Depois a
mesma mídia se dá conta que essas organizações podem receber dinheiro do Estado.
Estabelece-se a desconfiança, a entidade beneficiária passa a ser chamada pejorativamente
de ONG, as coisas ficam feias e, óbvio, começam a ser assombradas pelo fantasma
da corrupção.
No
primeiro caso, é certo que os recursos oriundos do orçamento estatal vão ajudar
a levar a efeito alguma política pública, que, a despeito de sua importância
social, é muito difícil de ser implementada na esfera governamental.
Tome-se o
exemplo de uma associação de amigos dum determinado igarapé, voltada para a revitalização
desse corpo d’água, e que desenvolve atividades como produção de mudas para
recuperação da mata ciliar; realização de mutirões para limpeza do leito; conscientização
e remoção de moradores de áreas de risco.
Ainda que
se trate de demanda de interesse da sociedade, decerto o Estado vai encontrar muitas
limitações nesse tipo de intervenção, inclusive (ou, talvez, principalmente) de
ordem financeira.
Não é
preciso ser nenhum expert para compreender que, se no contexto de uma entidade
ambiental (que pode contar, por ex., com o trabalho voluntário para redução de
gastos) um projeto pode ser executado a um custo módico, na administração pública
esses custos podem facilmente decuplicar.
O fato é
que, a partir da redemocratização do país, inúmeras organizações surgiram para
atuar no âmbito da sociedade civil – seja na defesa de interesses corporativos,
seja na defesa dos chamados direitos difusos, como os assuntos relacionados à
proteção do meio ambiente.
O fenômeno,
claro, não é genuinamente brasileiro: a influência dessas organizações é
reconhecida mundo afora, a ponto de o seu campo de ação ser classificado como Terceiro
Setor, que por sua vez cresce a taxas superiores às do Primeiro Setor (Estado)
e do Segundo Setor (mercado).
Especificamente
no que se refere às entidades ambientalistas, a crise ecológica decorrente do
aquecimento do planeta conferiu-lhes ainda mais relevância. Não à toa, nas
conferências das Nações Unidas e nas negociações de pactos globais como o
Acordo de Paris, que tem como alvo a redução do carbono presente na atmosfera,
os representantes dessas instituições recebem posição de destaque nos espaços
deliberativos.
Lamentavelmente,
os governos populistas, em especial em países em desenvolvimento, costumam
limitar o papel das organizações da sociedade civil, arvorando-se em únicos conhecedores
dos interesses do povo. Preferem inventar mecanismos fortuitos de participação
popular ao invés de promover o protagonismo da sociedade.
Voltando aos
deslumbramentos e desconfianças, diga-se que, conquanto duas CPIs tenham sido
instauradas, nenhum grande esquema de corrupção foi desvendado, nenhum
estratagema de repasse sistemático de dinheiro a ONGs foi comprovado.
Certamente
que, da mesma forma como acontece em relação aos órgãos estatais e às empresas,
as entidades da sociedade civil não estão imunes a casos isolados de desvios e
irregularidades. Mas o país dispõe de sistemas de controle e de organismos como
o Ministério Público e a Polícia Federal, que demandam investimento enorme da
sociedade para coibir a corrupção em todos os três setores.
Se por um
lado não existe tramoia para desvio contumaz de verba governamental, por outro
parece evidente que a despeito de sua natureza privada, as organizações da
sociedade civil precisam contar com recursos oriundos do orçamento público para
realizar atividades que são igualmente de interesse público.
A
experiência demonstra que quanto mais atuante é a sociedade, mais proeminente é
o Terceiro Setor e maior é a eficiência estatal na aplicação do dinheiro
público.
*Professor Associado da Universidade
Federal do Acre, engenheiro florestal, mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.
segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017
Mais mata ciliar
* Ecio Rodrigues
Depois de
muita discussão e controvérsia, o Código Florestal aprovado em 2012 acabou por não
aumentar a faixa mínima de mata ciliar a ser obrigatoriamente mantida nas
propriedades rurais, tendo estabelecido a mesma largura de 30 metros prevista
na legislação anterior.
Pior: nos
casos de recomposição – quer dizer, nas situações em que a mata ciliar já foi
desmatada além dos 30 metros –, a largura obrigatória cai para insignificantes 5
metros, algo totalmente insano.
A decisão
dos legisladores se mostrou um erro por várias razões – especialmente porque
torna consciencioso quem cumpre a lei, apesar de não adiantar muita coisa.
Quando se
fala nos serviços prestados pela mata ciliar, geralmente faz-se referência apenas
à prevenção de assoreamentos e desbarrancamentos; contudo, pesquisas demonstram
a estreita relação que existe entre a quantidade de biomassa florestal presente
na mata ciliar e o equilíbrio hidrológico dos rios.
A
interação entre água e florestas se evidencia sobretudo na Amazônia, diante da
ocorrência de sucessivos eventos extremos, envolvendo secas e alagações. O fato
é que, embora as florestas não possam evitar esses eventos, os efeitos deles
decorrentes são potencializados pelo desmatamento da mata ciliar.
Todavia,
uma faixa de 30 metros de largura não oferece o mínimo indispensável, em termos
de biomassa florestal, para possibilitar a necessária interação e promover
influência significativa sobre o fluxo do rio.
Por outro
lado, há mais um fator a objetar a largura mínima prevista no Código Florestal:
o fogo. Ocorre que na Amazônia, região designada como “Terra das águas”, por
conta de sua imensa rede hidrográfica, a prática agrícola da queimada é legitimada
pelas normas ambientais.
Ora, com
meros 30 metros de largura, a mata ciliar arde junto com o pasto submetido à
queimada e não impede que o fogo atinja os corpos d’água. Não há umidade
suficiente nessa exígua quantidade de biomassa florestal para evitar a
propagação do fogo – que vai aquecer a água, aumentar a evaporação, e
comprometer a fauna terrestre e a ictiofauna no local.
Ante a
óbvia constatação de que a largura mínima da mata ciliar não pode ser
determinada em função da disponibilidade de terras para criação de gado, a
pressão internacional levou o país a se comprometer, perante o “Acordo de Paris”
(pacto global que entrou em vigor em novembro de 2016), com a recuperação de
doze milhões de hectares de florestas nativas, a maior parte em mata ciliar,
até 2030.
É uma meta
ambiciosa para os padrões nacionais, já que isso nunca foi objeto de prioridade.
Por meio do Decreto 8.972/2017, o Executivo instituiu o que chamou de Política
Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa - Proveg.
Trata-se
de usar o dinheiro do orçamento federal para estimular estados e municípios a
conceber um plano, denominado por sua vez de Planaveg, prevendo a restauração
da mata ciliar dos rios que correm em seus respectivos territórios.
A
expectativa é que o Planaveg logre alargar a reduzida largura fixada pelo
Código Florestal para a faixa de mata ciliar, e forneça atratividade econômica a
esse tipo especial de floresta.
Melhor
ainda, as atividades de restauração florestal de mata ciliar, que abrangem coleta
de sementes de espécies nativas, produção de mudas e o próprio plantio restaurador,
podem se converter em importante mecanismo de geração de emprego e renda para
as frágeis economias das cidades do interior da Amazônia.
Jamais a extensão
da mata ciliar poderia ser contraposta à quantidade de solo disponível para a criação
de gado ou a produção de alimentos – foi aí que o debate perdeu o bom senso e
descarrilou de vez.
Afinal,
quem precisa de comida não vive sem água.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.
segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017
A Estação Ecológica e a produção de água no Rio Acre
* Ecio Rodrigues
Cresce mundo afora o consenso de que as florestas
tropicais, sobretudo as da Amazônia, devem ser remuneradas pelos serviços de
purificação do ar e da água que prestam à sociedade.
São os chamados “serviços ambientais”. No caso da
água, além de influir na qualidade, a floresta também contribui de maneira
efetiva na quantidade de água que corre em rios e igarapés. A floresta – para
usar um termo técnico – favorece a vazão e o equilíbrio hidrológico dos rios.
Reconhecer o serviço prestado pelas formações
florestais no fornecimento de água às populações urbanas é o primeiro passo
para se determinar o preço desse serviço – ou precificar, como gostam os economistas.
O último e mais complexo passo dessa equação se refere
ao estabelecimento dum mecanismo que faça chegar ao produtor que maneja a
floresta o dinheiro pago pelo benefício trazido por ela.
Nesse ponto, é preciso saber com clareza quem
demanda e quem oferta o serviço de melhoria na qualidade (e na quantidade) da
água. Pelo lado da demanda, as empresas distribuidoras devem pagar pelo
serviço; pelo lado da oferta, as propriedades que mantêm formações florestais
na área de influência do rio são as provedoras.
Deve ser mínima a participação estatal na intermediação
desse contrato especial de prestação de serviço – o ideal é que as empresas paguem
diretamente ao produtor, de forma proporcional ao tamanho da área de floresta
por ele manejada (ou conservada) em proveito do rio.
A Estação Ecológica do Rio Acre, unidade de
conservação criada em 1981 e localizada na nascente do rio que lhe empresta o
nome, no município de Assis Brasil, poderia configurar um excelente laboratório
para a estruturação dum sistema de pagamento que remunere o serviço de produção
de água na Amazônia.
Abrangendo
77.500 hectares de floresta nativa e situada na área de influência da cabeceira
do rio, essa Estação Ecológica, como deixa claro o decreto presidencial que a
criou, tem importância estratégica para as oito cidades abastecidas pelo rio Acre.
Por
outro lado, observa-se que é intensa a degradação florestal da mata ciliar na
maior parte dos 890 km cortados pelo rio Acre, desde a nascente até a foz, quando
desagua no Purus (no município de Boca do Acre). Essa degradação, não precisa
dizer, é causada pela pecuária destinada à criação extensiva de gado.
A
realidade da ação antrópica reforça a relevância da área de florestas presente na
Estação Ecológica para a manutenção de índices de vazão compatíveis com a
demanda urbana por água, atual e futura. As florestas intactas ali existentes
(sendo que permaneceram intactas por causa da unidade de conservação) são
fundamentais para o equilibro hidrológico do rio.
Lamentavelmente,
todavia, o Plano de Manejo que orienta o funcionamento dessa Estação Ecológica,
concluído mediante a elaboração dum conjunto expressivo de estudos, não
forneceu à produção de água a importância devida.
Por
seu turno, o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) nunca
se preocupou em calcular o valor econômico do serviço que a Estação presta à
água do rio Acre – no que se refere ao abastecimento urbano.
Certamente,
os recursos auferidos pelo pagamento desse serviço singular, além de custear as
atividades de manejo florestal necessárias à produção de água pela Estação Ecológica,
ajudariam a dinamizar a frágil e insipiente economia de Assis Brasil.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.
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