segunda-feira, 23 de julho de 2018

Japão constrói prédios de madeira, enquanto o gado se alastra no Acre


* Ecio Rodrigues
Poderia ser o contrário, mas não é.
Na região que abriga o bioma onde ocorre a maior quantidade e diversidade de espécies de madeira do mundo, o plantel de gado aumenta todos os anos, a despeito da consequente ampliação do desmatamento.
Enquanto isso, do outro lado do globo, a empresa japonesa Sumitomo Forestry vai construir, em plena Tóquio, uma das superfícies mais valorizadas do planeta, um edifício de 70 andares, todo em madeira (e aço).
O prédio de madeira alcançará 350 metros de altura e será ocupado por lojas, escritórios, hotel e apartamentos residenciais. O projeto prevê ainda a instalação de jardins em todos os 70 andares, inclusive com o plantio de árvores.
A ideia é metamorfosear a tradicional paisagem de concreto armado, característica do espaço urbano de Tóquio, mediante a introdução de um ecossistema vegetal, como forma de atrair para dentro da cidade maior concentração de pássaros e insetos – abelhas, por exemplo, espécie que se encontra ameaçada no mundo.
Com a construção e o funcionamento regular do empreendimento, os japoneses pretendem alavancar o surgimento de inovações num novo campo tecnológico, denominado como “Prédio Verde”.
Mesmo sendo mais caro, uma vez que o custo foi estimado em 600 bilhões de dólares, o que equivale ao dobro do valor de uma construção convencional em concreto, o emprego de madeira em 90% do arranha-céu (outros 10% correspondem a estruturas de sustentação em aço) se justifica pela adequação aos ideais de sustentabilidade.
O término da construção e a consequente inauguração do edifício estão programados para 2041. Significa mais de 20 anos de investimentos por parte de investidores do mercado imobiliário (para nós, é até estranho o negócio não envolver nenhuma empresa estatal). 
Estima-se que os 70 andares consumirão o equivalente a 185 mil metros cúbicos de madeira, número impressionante para a realidade japonesa; entretanto, apenas como simples análise comparativa, diga-se que no Acre, em 2015, foram produzidos 285.313 metros cúbicos de toras de madeira.
Desculpem, mas chegou o momento daquela perguntinha inconveniente. Considerando-se que a vocação produtiva do Acre e da Amazônia reside na exploração de sua diversidade florestal, e que a madeira desponta como a matéria-prima mais valiosa dessa biodiversidade, o que leva o uso da madeira a ser incentivado no Japão e não por aqui?
A resposta é bem mais simples do que se imagina: a política pública.
Ainda em 2010 o Japão aprovou regulamento intitulado “Lei de Promoção do Uso da Madeira em Edifícios Públicos” (em tradução tosca para o português).
Nos termos estabelecidos pela norma, os órgãos públicos devem funcionar em prédios de até 3 andares, construídos integralmente em madeira. É evidente que toda a madeira empregada é originária de árvores plantadas especificamente para emprego na construção civil.
Enquanto isso, na Amazônia em geral, e no Acre em particular, a política pública fornece crédito subsidiado para o cultivo de pasto, compra de matrizes de gado e promoção da atividade pecuária, sem levar em conta o óbvio: tudo isso é causa de desmatamento.
Para resumir, cidades que se ajustam ao Acordo de Paris constroem prédios de madeira, estados indiferentes continuam criando vacas.

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

segunda-feira, 16 de julho de 2018

Privatizar a Petrobras antes do fim do motor a diesel é decisão estratégica


* Ecio Rodrigues
Mesmo para quem desconhece os meandros do mercado mundial de petróleo, parece não haver dúvida que uma petroleira não pode, ou não aguenta!, ser gerida por meio de indicação política.
Sem embargo, os 60 anos de existência da Petrobras demonstram que a indicação política tem sido, por excelência, o procedimento usado para a escalação dos diretores dessa empresa.
Mas não apenas a Petrobras, essa premissa se aplica a todas as estatais brasileiras – sendo incontestável a situação precária de gerenciamento em que foram jogadas, por conta de tal condição.
A solução, obviamente, está na privatização. Caixa Econômica, Banco da Amazônia, Correios, Eletrobras e, claro, Petrobras devem ser privatizadas – só assim será possível estancar a sangria de recursos públicos a que dão causa, inclusive em função dos altíssimos salários e privilégios conferidos a seus diretores.
No caso da Petrobras, a sabotagem levada a efeito pelos caminhoneiros fez eclodir o debate acerca da privatização. Duas razões ajudam a explicar a premência desse debate
A primeira delas é apontada por economistas que se dedicam ao estudo da formação de preços de bens e serviços. Para eles, preço de combustíveis não pode – jamais! – ser definido por decreto.
Esses especialistas vão mais além ao demonstrar que, sendo uma empresa estatal, a Petrobras sofreu aparelhamento e ingerências para baixar o preço do diesel, contrariando as forças do mercado internacional.
No médio prazo, essa distorção causou os brutais prejuízos contabilizados no período entre 2003 a 2015, quando os dirigentes foram nomeados por governos de esquerda.
A segunda razão que torna a Petrobras um caso urgente de privatização diz respeito ao produto que a transformou numa gigante estatal – o petróleo.
Toda empresa que atua na indústria do petróleo, seja de gestão privada ou estatal, é obrigada a tomar decisões estratégicas, especificamente com relação a dois temas cruciais no atual cenário mundial: esgotamento de jazidas e crise ecológica decorrente do impacto de combustíveis fósseis para o aquecimento do planeta.
É verdade, ou um fato: tratando-se de um recurso não renovável na natureza, o petróleo acabará um dia, e esse dia está cada vez mais próximo.
Todos os países produtores e consumidores de petróleo, com maior ou menor determinação, se preparam para o inevitável esgotamento dessa matéria-prima, esforçando-se na busca de uma alternativa energética.
É verdade, ou um fato: o uso de petróleo como combustível vai se reduzir ao mínimo, em função da crise ecológica mundial.
Os 195 países que assinaram o Acordo de Paris em dezembro de 2015 se empenham para mitigar o aumento da temperatura planetária, e têm como foco imediato a substituição dos motores de combustão pelos motores elétricos.
Ou seja, ainda no curto prazo a demanda por gasolina e diesel em veículos, inclusive caminhões, será reduzida de maneira radical – o que levará a uma queda drástica no preço desses combustíveis na bomba.
Como o diesel é mais poluente que a gasolina, as indústrias automobilísticas vêm anunciando, sobretudo na Europa, o encerramento da produção de veículos com esse combustível. Significa que o motor a diesel está com os dias contados.
É verdade, ou um fato: a era do motor elétrico já começou, e o declínio da ultrapassada estatal brasileira do petróleo, também. 

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.