segunda-feira, 23 de março de 2015

Ampliação da largura de mata ciliar do rio Acre é urgente




* Ecio Rodrigues
A largura legal da faixa de mata ciliar do rio Acre, estabelecida pelo Código Florestal em vigor, não permite que a quantidade de florestas ali presente cumpra sua função com relação ao equilíbrio hidrológico do rio, sobretudo no que se refere à redução dos riscos de ocorrência de seca e alagações.
A largura legal da mata ciliar foi um dos temas mais polêmicos durante as discussões que culminaram na aprovação do novo Código Florestal, em maio de 2012.
De um lado, a grande maioria dos parlamentares, defensora da expansão da área de terra destinada ao plantio de soja, capim e outros cultivos, considerava que a mera existência de uma faixa de floresta nas margens dos rios, em especial diante da imensa hidrografia que caracteriza a Amazônia, é prejudicial ao agronegócio, na medida em que reduz os solos disponíveis para o exercício da atividade.
De outro lado, uma minoria de parlamentares, com o apoio do movimento ambientalista, defendia a permanência da largura mínima de faixa de mata ciliar prevista no Código Florestal de 1965. Ou seja, com receio de que ocorresse um retrocesso, procurava-se garantir, pelo menos, o que a legislação anterior determinava.
Mediante estudo então divulgado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC e Academia Brasileira de Ciência - ABC, foi comprovada a estreita relação que existe entre a quantidade de florestas presentes ao longo das margens de um rio – isto é, a largura da faixa de mata ciliar – e o equilíbrio hidrológico desse respectivo curso d’’agua.
Os cientistas demonstraram ainda que a ampliação da largura legal da mata ciliar não comprometeria a produção do agronegócio – ao contrário, auxiliaria no aumento da produtividade, o que, evidentemente, era muito mais importante.
Faltava analisar os impactos econômicos que a ampliação da faixa de mata ciliar poderia ter sobre a propriedade rural e para o agronegócio.
Estudo decisivo levado a cabo pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o Ipea, órgão de assessoria técnica do Governo Federal, reforçou a tese de que o serviço prestado pela mata ciliar na quantidade e na qualidade da água que flui no rio compensaria eventual perda de área cultivada pelo agronegócio.
Se (e somente se) os parlamentares, antes de assumir posicionamentos em matérias de cunho técnico-científico, tivessem o hábito de ouvir os cientistas da SBPC/ABC, ou ainda os renomados economistas do Ipea, o novo Código Florestal teria ampliado a largura da mata ciliar, e o quadro atual da crise da água poderia ser outro.
Mas, infelizmente, não é assim que funciona o trabalho legislativo. Parlamentares com pouca formação, indiferentes à ciência, costumam ser induzidos por justificativas e motivações que ferem o bom senso.
Sem embargo, a despeito do anacronismo que permeou a votação da legislação aprovada em âmbito federal, estados e municípios podem legislar sobre o tema. Significa dizer que leis estaduais e municipais podem ampliar a largura da mata ciliar, nunca reduzi-la.
A boa notícia é que os pesquisadores conceberam metodologia específica para chegar-se a uma “largura técnica” de mata ciliar, levando-se em conta as peculiaridades de um determinado trecho de rio. Uma largura adequada, sob o ponto de vista técnico-ecológico, para a conservação da água, e calculada para melhorar o desempenho das formações florestais presentes na mata ciliar, em relação ao equilíbrio hidrológico do rio.
O caso do rio Acre é sintomático. Com alagações e secas ocorrendo todos os anos desde o final da década passada, parece ser o momento de escutar o alerta da ciência.
Mais que sujar os pés de lama, os gestores públicos devem empenhar-se, no propósito de ampliar a largura da faixa de mata ciliar do rio Acre. Esse é o caminho!

* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

sexta-feira, 20 de março de 2015

IX Semana Florestal do Acre

A IX Semana Florestal do Acre vem em 2015 com o tema "FLORESTAS E ÁGUA", um equilíbrio mútuo e importante para todos nós. Uma programação repleta de palestras, minicursos, prática em campo e muitas novidades. Venha Fazer parte!


terça-feira, 17 de março de 2015

Empresas que extraem e industrializam madeira devem ter engenheiro florestal



O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) determinou que todas as empresas do Rio Grande do Sul que trabalham com extração florestal ou industrialização de madeira tenham um engenheiro florestal como responsável técnico e não um engenheiro agrônomo. A decisão da 4a Turma, tomada em julgamento na última semana, deu provimento a recurso de três entidades de classe gaúchas que representam os engenheiros florestais.
A Associação Gaúcha de Engenheiros Florestais, a Sociedade dos Engenheiros Florestais do RS e a Sociedade Santamariense de Engenheiros Florestais ajuizaram ação na Justiça Federal contra o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do RS (CREA/RS). Segundo as entidades, o conselho tem permitido o registro de empresas do setor com inscrição de engenheiro agrônomo como técnico responsável.
As autoras argumentam que o engenheiro agrônomo não tem capacitação para atuar nessa área específica, carecendo de conhecimentos aprofundados de tecnologia e industrialização, tratamento e preservação da madeira. Argumentam que a avaliação das propriedades físico-químicas e anatômicas da madeira é um conhecimento próprio da formação dos engenheiros florestais.
A ação foi julgada improcedente em primeira instância e as autoras recorreram ao tribunal. O relator do processo, desembargador federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle, ressaltou que embora a Lei 5.194/66 defina de forma genérica as atribuições de engenheiros e arquitetos, uma resolução posterior (Confea nº 218/73) definiu claramente as competências de cada modalidade de engenharia. “Assim, as empresas que desenvolvem atividades extratoras florestais e industrializadoras de madeira - serraria/madeireira ensejam a contratação de responsável técnico profissional engenheiro florestal”, concluiu o desembargador, reformando a sentença.


fonte: Painel Florestal

segunda-feira, 16 de março de 2015

A alagação pode ser evitada?




* Ecio Rodrigues
Os pesquisadores e cientistas são capazes de explicar de forma lógica e convincente as razões pelas quais em alguns lugares ocorre a diminuição das chuvas e em outros, o aumento. Explicam, sob elevado grau de certeza, o percurso assumido pelas nuvens carregadas de água e o que as impulsiona numa ou noutra direção.
Todas as vezes que uma grande quantidade de nuvens estaciona num determinado ponto do céu, ou, melhor dizendo, da atmosfera, as cidades embaixo vão sofrer uma descarga elevada de pluviosidade, provocando exclamações como “choveu em duas horas o que normalmente chove no mês inteiro”.
Porém, antes de se discutir esse tipo de estatística fatalista, divulgada na tentativa de diluir as verdadeiras causas do problema e a imputação de responsabilidades, é importante destacar que os pesquisadores e cientistas são, igualmente, capazes de aferir a resiliência dos cursos d’água.
Por resiliência dos cursos d’água, entenda-se a eficiência com que os rios e igarapés absorvem e drenam a imensa quantidade de água que recebem nas enxurradas.
Cabe destacar, desde logo, que há estreita vinculação entre o desmatamento na Amazônia e a movimentação das nuvens carregadas de água. Não há dúvida científica quanto ao fato de que a substituição das florestas por pastos, para criação de gado, está na raiz da atual crise ecológica, caracterizada, sobretudo, pela mudança no clima.
Por sinal, o desmatamento das florestas na Amazônia é uma das principais causas que explicam tanto a movimentação das nuvens carregadas de água – que podem causar alagação no inverno e seca no verão – quanto o assoreamento e a consequente redução dos calados dos rios e de outros canais de drenagem.
Os mais antigos haverão de recordar a intensa cabotagem que movimentava os rios Acre e Purus (para citar apenas os mais atingidos pela alagação que atingiu o território do Acre em 2015) até a segunda metade do século passado.
Fotos desse período comprovam que esses rios permitiam o tráfego de gaiolas, como eram chamados os grandes navios usados para o transporte de borracha e de pessoas até meados da Segunda Guerra Mundial. Todavia, essa navegação é impossível atualmente, por uma razão simples: os navios encalham, já que os rios estão rasos.
Acontece que, todos os anos, uma imensa quantidade de terra é depositada no fundo dos rios pelas chuvas e ventos. Essa mistura de areia e barro é levada das áreas desmatadas, que não contam com a proteção fornecida pelas formações florestais.
Em outras palavras: o desmatamento retira do solo a barreira física representada pela existência das florestas, possibilitando o carreamento do solo para dentro do rio. Por conseguinte, o rio terá sua resiliência reduzida, ficando com menor profundidade para receber grandes descargas de água e para permitir a navegação em seu leito.
Há quem acredite que os desmatamentos realizados em áreas distantes do rio não contribuem para o assoreamento. Nada mais equivocado. Numa região como a Amazônia, caracterizada por intensa rede de drenagem, onde igarapés abundam em todos os lados e direções, a terra será levada da pastagem para algum canal de drenagem. Esse canal, por sua vez, em algum momento, chegará, primeiro aos afluentes, depois aos rios secundários, em seguida aos principais, e assim por diante.
Coibir novos desmatamentos para ampliação da pecuária e reflorestar os pastos sujos e abandonados, que representam quase 30% da área total desmatada – essas são medidas de política pública passíveis de ser realizadas no médio prazo.  Por outro lado, aumentar o calado dos rios com a dragagem da terra acumulada no fundo é uma medida de política pública que pode ser realizada imediatamente, já. Afinal, em junho vem a seca.
            Encontra-se na resistência pública e resiliência dos cursos d’água a resposta para minimizar e até evitar os efeitos de eventos climáticos extremos, como as alagações.

* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

segunda-feira, 9 de março de 2015

A alagação nossa de cada ano




* Ecio Rodrigues
Descartada a hipótese de que tudo foi obra do acaso – ou, como as mães explicam aos pequenos, “São Pedro resolveu lavar o salão, pois vai ter festa no céu” – o momento é mais que oportuno para se encetar uma discussão, a mais técnica possível, a respeito das causas da alagação, a maior da história desde que se iniciaram as medições.
Para início de conversa, convém estabelecer um critério. Independentemente da dimensão da inundação provocada pelo rio Acre ou por outros rios que cortam o território estadual (como o Tarauacá, que alagou no final do período seco; ou o Purus, que afundou Boca do Acre), a aferição da maior cota já atingida pelo nível das águas não pode ser o mote do debate. Ou seja, o importante não é o tamanho da alagação, mas sua recorrência.
A constatação inegável é a de que desde a segunda metade da década de 2000 o evento da alagação (quando o rio transborda) vem ocorrendo anualmente. O erro grave e corriqueiro nesse ponto é achar que, como antes, o período de intermitência entre uma alagação e outra corresponde a uma média dez anos, o que daria tempo para a cidade esquecer e se recuperar. Não, as alagações dos rios no Acre se tornaram uma realidade, vão acontecer todos os anos, e a política pública deve se preparar para isso.
Significa que devem ser incorporadas à rotina das administrações, nas prefeituras e no estado, ações voltadas à resistência pública, a fim de contornarem-se os efeitos do problema; e, o mais importante, para chegar à causa, devem ser alavancados programas destinados a ampliar a resiliência dos rios frente ao aumento abrupto de sua vazão.
Resistência pública e resiliência dos cursos d’água – esses são os pontos-chave. Por resistência pública, entenda-se a capacidade de cumprir a legislação ambiental e urbanística, no que concerne à ocupação dos espaços urbanos. Vale dizer, deve ser superada a costumeira permissividade com que se encara o assentamento humano em áreas sujeitas a inundação e por isso impróprias à edificação. As terras situadas em cotas inferiores à do rio ou em chavascais que alagam só pela força das chuvas devem ser desocupadas e convertidas em áreas verdes, de modo que não voltem a ser invadidas.
Já a avaliação sobre a resiliência dos fluxos d’água é bem mais complexa e remete à análise do processo de ocupação produtiva da região. Por resiliência, entenda-se a capacidade dos rios e igarapés de reagirem aos extremos de vazão. Quanto mais rapidamente o rio retoma o seu equilíbrio hidrológico depois de receber uma quantidade excessiva de água vinda da chuva, mais alta é a sua resiliência.
Parece óbvio que o desmatamento está na raiz do problema: a remoção da mata ciliar causa o assoreamento, o que, por sua vez, diminui a resiliência dos cursos d’água.
Considerando-se, por outro lado, que estudos recentes demonstram a estreita relação que existe entre o desmatamento na Amazônia e a seca que aflige o Sudeste, parece óbvio que o desmatamento, que em geral tem como ensejo a instalação da pecuária, está na raiz de todos os problemas envolvendo a água – seja pela seca, seja pela alagação; seja na Amazônia, seja em outras regiões do país.
Seria utópico imaginar que as áreas destinadas à criação de boi podem, no longo prazo, voltar a ser florestas, mediante o cultivo de árvores com valor econômico ou a restauração florestal com o emprego de espécies nativas. A importância política da pecuária na Amazônia é quase incompreensível e merece um estudo em separado.
Todavia, é plenamente plausível resolver, no curto prazo, a degradação hoje verificada na mata ciliar dos rios e igarapés do Acre. Sob um custo compatível com a realidade econômica local e com muita vontade política, a faixa de mata ciliar poderia ter sua largura dobrada, para além do que determina o Código Florestal. Os trechos desmatados, por seu turno, poderiam ser submetidos à restauração florestal imediata. Um alento: existe tecnologia para isso.
Mais que botar os pés na lama, os gestores devem resolver o problema da mata ciliar nos rios do Acre, já. Afinal, em junho vem a tragédia da seca. É só esperar.    

* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.