* Ecio Rodrigues
Muitos produtos florestais poderiam ganhar
importância econômica expressiva na Amazônia. Contudo, em absolutamente nenhum
estado amazônico a produção florestal é considerada prioridade pela política
pública. E o que é pior: esse desdém da ação pública se funda em argumentos que
não resistem a uma análise minimamente criteriosa.
No caso, por exemplo, da fauna silvestre, o
manejo florestal de animais nativos para a produção de carne e mesmo para a
comercialização dos chamados bichos de estimação (reconhecidos pela sigla em
inglês PET) não é prioridade nem sequer é levado em consideração pela política
pública, por razões que chegam a ser risíveis diante de sua improbabilidade,
mas que atrapalham a capacidade de análise de uma sociedade como a nossa, carente
de informações de qualidade.
O raciocínio simplório – e equivocado, sob o
ponto de vista econômico e ambiental – funciona mais ou menos assim: deve-se criar
dificuldades para o licenciamento do manejo de fauna, uma vez que a organização
de uma cadeia produtiva para a oferta de animais silvestres irá acobertar a captura
ilegal desses animais no interior da floresta.
Por mais absurdo que pareça, esse raciocínio tortuoso
prevalece no âmbito dos órgãos de controle ambiental e sempre
contamina qualquer discussão envolvendo o estabelecimento de um mercado
legalizado para a fauna. Pois os resultados obtidos em décadas de contradição e
falta de rumo são mais que evidentes nas estatísticas concernentes ao comércio de
animais silvestres oriundos da Amazônia.
Estatística fornecida pela Convenção sobre o
Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Silvestres Ameaçadas de
Extinção (Cites, na sigla em inglês) dá conta que
no período entre 2000 e 2006 o Brasil, oficialmente, exportou 52 araras, 100
papagaios, 61 saguis, 6 jibóias e nenhum iguana. No mesmo período, a Holanda
exportou 2.213 papagaios; a Inglatera, 520 saguis; a República Checa, 12.531
jiboias; os Estados Unidos, 683 araras e 13.486 iguanas.
Nem o mais otimista dos ambientalistas defensores
da hipocrisia de se evitar um mercado legal para animais silvestres amazônicos poderá
endossar que a ausência de um mercado forte e legalizado tem ajudado a evitar a
comercialização desses animais, vivos ou mortos, por baixo dos panos e das
bancas de feiras livres.
Tratados como se fossem drogas, os animais
amazônicos continuam sendo negociados – ou traficados – na região e fora dela, a
despeito das penas cominadas para o infrator – ou traficante –, uma vez que o
comércio ilegal de animais silvestres é tipificado como crime ambiental, e durante
certo tempo foi considerado até inafiançável.
Para contornar o fato e a evidência de que
comprometer o mercado legal não ajuda a combater o ilegal, eles, os
ambientalistas, distantes da realidade, depositam suas expectativas e
direcionam sua frustração para o óbvio: a falta de capacidade de fiscalização
do aparato estatal de controle.
Não conseguem entender que um aparato de fiscalização
“ideal” é simplesmente inviável, por seu custo e amplitude imensuráveis. Não
conseguem entender, de outra banda, que os custos da fiscalização levada a cabo
pelo Estado, extremamente elevados, são pagos pela sociedade, que, por sua vez,
não vê nenhum retorno, embora conviva com o eterno paradoxo de concordar em
financiar algo que não resolve nada, na singela esperança de que um dia venha a
resolver.
Todavia, a pergunta permanece. Será que o
mercado legal de animais silvestres aquece o mercado ilegal na Amazônia? A
resposta é um sonoro NÃO.
A
probabilidade de um produto comercializado no mercado legalizado acobertar ou
aquecer o produto do mercado ilegal contraria todas as premissas da teoria
econômica, sendo, desse modo, ínfima, inferior a 0,1% para alguns produtos.
Mas, como a ínfima probabilidade existe,
parece ser suficiente para que o mercado legal não vingue e o ilegal prolifere.
Que fazer?
*
Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal,
Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em
Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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