domingo, 18 de agosto de 2013

A Domesticação Nem Sempre é a Melhor Saída



* Ecio Rodrigues
No âmbito da produção florestal, a opção pela domesticação de espécies de valor comercial é uma tendência de mercado. Essa tendência se concretiza quando existe uma demanda crescente pelo produto florestal, e a ocorrência da espécie em ambiente natural, dentro do ecossistema, proporciona oferta limitada, em vista da pequena quantidade de árvores dispersas por hectare.
Ante a inelasticidade da oferta, a ampliação da demanda pelo produto florestal força a inclusão de novas áreas no sistema produtivo até um determinado limite. Mantida a demanda crescente, mesmo após o novo limite de produção ter sido alcançado com a inclusão das novas áreas, o mercado começa a investir na domesticação da espécie, a fim de continuar o atendimento da demanda e ampliar os ganhos com a produção.
Trata-se de raciocínio relativamente simples e de fácil comprovação na história da ocupação produtiva da Amazônia e dos ciclos econômicos de alguns produtos florestais, como borracha, óleo de pau-rosa, pupunha, cupuaçu e, claro, cacau.
Essa relação de causa e efeito entre a inelasticidade da oferta e a domesticação decorrente do aumento da demanda, no caso das espécies florestais com importância comercial, foi muitas vezes abordada em documentos acadêmicos.
Todavia, nenhum desses estudos atentou para o fato de que a demanda pode assumir algumas especificidades, criando nichos de mercado para os produtos provenientes das árvores nativas, ou seja, das árvores que permanecem no ecossistema.
Acontece que, por razões variadas e de difícil aferição, as espécies florestais que se encontram no interior do ecossistema podem, ao longo de um permanente e ininterrupto ciclo de reprodução, manter e aprimorar características exclusivas, atraindo, para o produto florestal, um público específico, que busca justamente esse diferencial.
Ao que parece, há algum tipo de relação de interdependência com o ambiente, que faz com que essas características exclusivas sejam, como a própria expressão indica, exclusivas das árvores encontradas no ecossistema florestal.
O caso do látex usado como matéria-prima na produção de preservativos é um bom exemplo. Segundo estudos realizados pela fábrica de preservativos masculinos instalada no Município de Xapuri-AC, que produz a marca Natex, o látex oriundo do seringal nativo, isto é, o látex extraído das árvores de seringueira existentes na floresta nativa apresenta melhores coeficientes técnicos para a produção de preservativos, fornecendo maior resistência ao produto.
Como a resistência é uma característica importante para o preservativo, o produto confeccionado com o látex procedente dos seringais nativos tem sua demanda mantida pelo mercado – ou melhor, por um nicho do mercado de preservativos – pois, quando a mesma espécie é cultivada em seringais plantados essa característica exclusiva desaparece.
Significa que, embora o mercado dos preservativos oriundos das seringueiras cultivadas responda por mais de 95% do consumo desse produto, uma pequena parte dos consumidores irá permanecer no universo dos 5% que preferem os preservativos confeccionados a partir da borracha nativa.
Pode-se dizer então que, mesmo havendo uma demanda permanente pelas características exclusivas, o que impede a total e definitiva domesticação da espécie florestal, a quantidade de consumidores que valorizam essas características, a ponto de aceitar pagar a mais por elas, será sempre expressivamente inferior à quantidade de consumidores que continuam movimentando o mercado do cultivo. As características exclusivas, dessa forma, atendem não aos grandes mercados dos produtos florestais, mas a pequenos quinhões, a pequenos nichos desses mercados.
A domesticação não é a única resposta para os impasses econômicos da produção florestal. É possível gerar renda manejando a espécie no interior da floresta. Para a Amazônia, essa a melhor saída.
  
 * Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).

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