* Ecio Rodrigues
No âmbito da produção florestal, a opção pela domesticação de espécies de
valor comercial é uma tendência de mercado. Essa tendência se concretiza quando
existe uma demanda crescente pelo produto florestal, e a ocorrência da espécie
em ambiente natural, dentro do ecossistema, proporciona oferta limitada, em
vista da pequena quantidade de árvores dispersas por hectare.
Ante a inelasticidade da oferta, a ampliação da demanda pelo produto
florestal força a inclusão de novas áreas no sistema produtivo até um
determinado limite. Mantida a demanda crescente, mesmo após o novo limite de
produção ter sido alcançado com a inclusão das novas áreas, o mercado começa a
investir na domesticação da espécie, a fim de continuar o atendimento da
demanda e ampliar os ganhos com a produção.
Trata-se de raciocínio relativamente simples e de fácil comprovação na
história da ocupação produtiva da Amazônia e dos ciclos econômicos de alguns
produtos florestais, como borracha, óleo de pau-rosa, pupunha, cupuaçu e,
claro, cacau.
Essa relação de causa e efeito entre a inelasticidade da oferta e a domesticação
decorrente do aumento da demanda, no caso das espécies florestais com
importância comercial, foi muitas vezes abordada em documentos acadêmicos.
Todavia, nenhum desses estudos atentou para o fato de que a demanda pode
assumir algumas especificidades, criando nichos de mercado para os produtos
provenientes das árvores nativas, ou seja, das árvores que permanecem no
ecossistema.
Acontece que, por razões variadas e de difícil aferição, as espécies
florestais que se encontram no interior do ecossistema podem, ao longo de um
permanente e ininterrupto ciclo de reprodução, manter e aprimorar características
exclusivas, atraindo, para o produto florestal, um público específico, que
busca justamente esse diferencial.
Ao que parece, há algum tipo de relação de interdependência com o
ambiente, que faz com que essas características exclusivas sejam, como a
própria expressão indica, exclusivas das árvores encontradas no ecossistema
florestal.
O caso do látex usado como matéria-prima na produção de preservativos é
um bom exemplo. Segundo estudos realizados pela fábrica de preservativos
masculinos instalada no Município de Xapuri-AC, que produz a marca Natex, o
látex oriundo do seringal nativo, isto é, o látex extraído das árvores de
seringueira existentes na floresta nativa apresenta melhores coeficientes
técnicos para a produção de preservativos, fornecendo maior resistência ao
produto.
Como a resistência é uma característica importante para o preservativo, o
produto confeccionado com o látex procedente dos seringais nativos tem sua
demanda mantida pelo mercado – ou melhor, por um nicho do mercado de
preservativos – pois, quando a mesma espécie é cultivada em seringais plantados
essa característica exclusiva desaparece.
Significa que, embora o mercado dos preservativos oriundos das
seringueiras cultivadas responda por mais de 95% do consumo desse produto, uma
pequena parte dos consumidores irá permanecer no universo dos 5% que preferem
os preservativos confeccionados a partir da borracha nativa.
Pode-se dizer então que, mesmo havendo uma demanda permanente pelas características
exclusivas, o que impede a total e definitiva domesticação da espécie florestal,
a quantidade de consumidores que valorizam essas características, a ponto de aceitar
pagar a mais por elas, será sempre expressivamente inferior à quantidade de
consumidores que continuam movimentando o mercado do cultivo. As características
exclusivas, dessa forma, atendem não aos grandes mercados dos produtos
florestais, mas a pequenos quinhões, a pequenos nichos desses mercados.
A domesticação não é a única resposta para os impasses econômicos da
produção florestal. É possível gerar renda manejando a espécie no interior da
floresta. Para a Amazônia, essa a melhor saída.
* Professor da
Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal
e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná
(UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de
Brasília (UnB).
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