* Ecio Rodrigues
Na
seca do rio Acre, falta água ou falta chuva? Embora pareça um tanto idiota, a
pergunta é mais que oportuna. E a resposta ajuda a entender o problema,
evitando-se a tradicional ladainha da imprensa: Vai alagar? Vai secar?
Certamente
a quantidade de água que integrava o ciclo hídrico da bacia do rio Acre, e que
foi perdida juntamente com as árvores removidas ou queimadas durante o processo
de desmatamento, é maior que a água da chuva que teima em não vir. A triste resposta
é que falta agora e continuará faltando a água que foi perdida no desmatamento
para todo o sempre.
Acontece
que o equilíbrio hídrico foi corrompido no final da década de 1980, quando as
taxas de desmatamento para a ocupação da pecuária de gado estavam no pico, tendo
batido recordes alarmantes em 1994 e em 2005, uma década depois.
De lá (1994)
para cá (2016), houve muita “educação ambiental”, muita publicidade destacando
o amor à natureza, muita propaganda de que no Acre tudo é diferente, e pouquíssima,
quase nenhuma, política pública para encontrar soluções. O problema da queimada
continua o mesmo – nas áreas já desmatadas e nas que ainda virão a ser, em
2016, 2017, 2018...
Discursos
e proselitismos não vão fazer a água aparecer nem resolver os impactos
decorrentes da seca e da alagação. A recuperação do equilíbrio do ciclo da água
que corre na bacia hidrográfica do rio Acre depende de ações concretas, de medidas
voltadas para barrar o desmatamento e a irmã gêmea deste, a queimada.
Mas,
como é impossível desvincular esses males da pecuária, em última análise o
combate ao desmatamento e às queimadas implica a imputação, a essa atividade,
de gravames e taxações que a tornem menos atrativa frente a outras opções
empresariais de investimento.
Basta
dizer que não se combate o desmatamento com incentivos ficais à pecuária. Como a
redução de 80% recentemente concedida sobre o ICMS cobrado para levar boi vivo ao
abate em Rondônia. Em plena seca, as queimadas batendo recordes, e a prioridade
do governo é incentivar a pecuária. Insano, não?
E
também não adianta fingir que os céus são os culpados.
Por
sinal, desde 2000 os gestores públicos repetem o falso mantra de que o volume
absurdo de fumaça que todos os anos aflige o Acre não se origina da grande
quantidade de queimadas anualmente registrada por satélite em território
estadual: insiste-se que a fumaça é trazida pelo vento, que vem da Bolívia, de Rondônia,
Mato Grosso, enfim, de qualquer lugar que não seja o próprio Acre.
Estudo
realizado ainda em 2008 pelo Inpe, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, instituição
que compõe o seleto grupo de órgãos estatais com reputação inconteste, trouxe
certeza ao que já era óbvio: onde há fumaça, há fogo! A fumaça que nos sufoca e
que faz lotar os hospitais é produzida no Acre mesmo.
Derrubada
a hipótese da “curva do vento” pelo Inpe, as explicações se voltam para os fenômenos
climáticos, que, como não poderia ser diferente, são responsabilidade dos
americanos, cujas indústrias jogam no céu uma quantidade infinita de fumaça.
Quer
dizer, a culpa, novamente, recai sobre fatores sobre os quais não se tem
governabilidade: os céus, os americanos e suas indústrias são os responsáveis
pela ocorrência do El Niño, que faz secar o rio Acre. Pronto. Basta continuar
com as campanhas pedindo socorro ao rio e às florestas do Acre para se obter um
bônus de consciência e dormir sossegado.
Quando
2017 chegar, com seca ou alagação, com desmatamento e queimadas, vai dar para
ver as novidades trazidas pelos céus. E continuar de consciência tranquila.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.
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