domingo, 27 de setembro de 2015

Boi não paga o custo da água que bebe e do solo que danifica




* Ecio Rodrigues
Um estudo divulgado agora, na segunda quinzena de setembro, alerta os bancos e agências de financiamento quanto aos elevados custos gerados pela criação de boi na Amazônia, em relação ao capital natural (representado, sobretudo, por água e solo).
O estudo foi elaborado pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, CEBDS, com apoio da Agência Alemã de Cooperação, GIZ, e publicado com o sugestivo título “Exposição do Setor Financeiro ao Risco do Capital Natural”. Foram analisados 45 setores produtivos – do petróleo à pecuária, passando por produtos químicos e energia.
Os resultados são impressionantes. Para cada milhão de reais obtido em receita pela criação de gado na Amazônia existe um custo de 22 milhões de reais em impactos ambientais a serem reparados.
Significa, como afirma o estudo, que o financiamento da pecuária importa em investimento de alto risco, uma vez que se trata de um dos setores produtivos de maior custo de capital natural. Custos esses que, quando internalizados, tornam a pecuária inviável.
Como o estudo tem o propósito de orientar os bancos e outros agentes que captam recursos para investimento produtivo, o recado não poderia ser mais claro: investir na pecuária de gado na Amazônia é um péssimo negócio, de alto risco para o retorno do capital e com sustentabilidade comprometida.
Trata-se, sem nenhuma dúvida, de um dos mais duros golpes sofridos pela pecuária na região. Afinal, não é todo dia que o próprio mercado chama a atenção de seus agentes econômicos para um ponto elementar em todo negócio: viabilidade no médio prazo.
O relatório aponta ainda a resolução 4.327 do Banco Central, aprovada em 2014, que impõe o ônus da responsabilidade compartilhada ao financiador de projetos envolvendo custos expressivos para o capital natural.
Entenda-se por capital natural, no caso da pecuária extensiva na Amazônia, a água que o boi bebe e o solo que danifica. Acontece que o gado, na criação extensiva, consome grande quantidade de água – uma média de 36 litros de água por dia e por vaca.
Por outro lado, pesquisas da Embrapa comprovam que o gado, ao pastar, arranca e estraga a camada fértil do solo, que é compactado pelo pisoteio dos animais. Diariamente, uma área expressiva de terra é percorrida por cada boi.
O custo para o capital natural aumenta de maneira exponencial quando a terra destinada à criação de boi integra matas ciliares ou encostas íngremes. A recuperação dessas áreas, mais vulneráveis, exige procedimentos de maior complexidade, uma vez que, entre outras condições, deve levar em conta as características do solo degradado e do relevo, implicando maiores gastos.
Não é de hoje que pesquisadores vinculados às universidades amazônicas, à Embrapa e ao Inpa, só para citar as instituições mais envolvidas com o debate sobre a ocupação produtiva na Amazônia, alertam para os impactos ambientais gerados pelo desmatamento decorrente da instalação da pecuária de gado.
O que o estudo levado a cabo pelos empresários (finalmente) trouxe à tona é que, considerando-se a dinâmica econômica da região, o alto custo do capital natural representado pelo consumo de água e degradação da terra torna inviável atividade da pecuária para a criação de boi praticada na Amazônia.
Melhor ainda, pôs o guiso da responsabilidade no pescoço dos bancos estatais que financiam a pecuária na região – algo que o governo nunca teve coragem de fazer.

* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

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