* Ecio Rodrigues
A
Constituição Federal estabelece o regime de competência concorrente entre os
entes federativos para legislar sobre questões relacionadas à defesa,
conservação e proteção do meio ambiente. Significa que à União cabe preceituar sobre
normas gerais, deixando aos Estados e Distrito Federal competência complementar
e supletiva. Quanto aos Municípios, estes também podem formular seus próprios
ordenamentos, na medida em que lhes é permitido legislar sobre assuntos de
natureza local.
Grosso
modo, pode-se dizer que, em matéria ambiental, os Estados podem legislar, desde
que não contrariem as normas federais; por sua vez, os Municípios não podem se
contrapor à legislação federal e à estadual.
A
despeito dessa sistemática estabelecida no plano da competência legislativa
ambiental, o que se se observa é que não raro os entes estaduais e municipais se
restringem meramente a reproduzir as prescrições da legislação federal, abrindo
mão da prerrogativa de que dispõem, de aprimorar e aprofundar as regras gerais de
proteção do meio ambiente com a introdução de suas próprias estipulações (que,
evidentemente, devem ser mais restritivas que as federais).
É o
que ocorre no caso específico da mata ciliar. A legislação federal, notadamente
o Código Florestal, classifica a mata ciliar como Área de Preservação
Permanente, estabelecendo uma faixa mínima de floresta a ser mantida em função
da largura do rio ou corpo d’água. Pois bem. Ao elaborarem suas normas
ambientais, Estados e Municípios se limitam a repetir a largura mínima fixada
pelo Código Florestal, preferindo não se intrometer numa matéria geralmente tão
polêmica.
Todavia,
se do ponto de vista dos interesses políticos parece ser mais vantajoso deixar para
o governo federal o encargo de ditar as regras alusivas à mata ciliar, do ponto
de vista técnico, quando se avalia o resultado obtido em face da regra federal na
realidade de cada localidade, o retorno para a sociedade é bastante questionável.
Cientistas,
por meio da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e da Academia
Brasileira de Ciência, não cansam de se referir à existência de estudos demonstrando
que a mata ciliar impede o assoreamento dos rios. Não há dúvida científica quanto
a isso, é um fato. Da mesma forma, é fato científico que quanto maior a largura
da faixa de mata ciliar, menor será o assoreamento dos rios.
Ou
seja, a largura mínima da faixa de mata ciliar estabelecida pelo Código
Florestal (30 metros) é, cientificamente, mínima.
Por conseguinte, vai impedir o mínimo
de assoreamento. Na prática, essa largura nem sempre é apropriada e, dependendo
da situação do rio, não é suficiente, sendo indispensável a sua ampliação.
Os
gestores estaduais e municipais devem ser mais resolutos, portanto, e acionar os
parlamentares para a aprovação de regras ajustadas à necessidade de suas bacias
hidrográficas, a fim de aumentar-se a quantidade de florestas existentes na
mata ciliar e, desse modo, fornecer maior proteção aos fluxos d’água e reduzir
os riscos de ocorrência de secas e alagações.
Nada
mais oportuno para um município como Brasiléia, por exemplo. Localizada na
fronteira do Acre com a Bolívia, a cidade quase desapareceu do mapa na alagação
de 2015. Com vistas a se prevenirem novas catástrofes, o prefeito e os
vereadores de Brasileia deveriam preocupar-se em discutir uma largura de mata
ciliar específica e compatível com aquela realidade.
Por
sinal, em 2010, pesquisadores oriundos da Engenharia Florestal da Universidade
Federal do Acre envolvidos no “Projeto Ciliar Só-Rio” realizaram uma audiência
pública na Câmara de Brasiléia, tendo apresentado uma proposta de “Lei
Municipal da Mata Ciliar” – que estipulava uma faixa marginal de florestas tecnicamente
adequada para o rio Acre, no trecho em que esse rio corta o território
municipal.
A
despeito do esforço dos pesquisadores, contudo, os vereadores não deram a
mínima. O estrago causado pela histórica alagação demonstra o quanto estavam –
e infelizmente continuam – errados.
* Professor Associado da Universidade Federal do Acre,
engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal
e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.
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