domingo, 20 de outubro de 2013

Sobre o extrativista manejador florestal na década de 2010



* Ecio Rodrigues
As reservas extrativistas, a tecnologia do manejo florestal comunitário e a tecnologia do manejo florestal de uso múltiplo (que ainda se encontra em elaboração) são concepções que os profissionais da engenharia florestal e os extrativistas do Acre legaram à Amazônia.
A rigor, como os próprios extrativistas costumam dizer, uma coisa levou à outra. Vale dizer, a segregação de espaços territoriais específicos para o modo extrativista de produção demonstrou que a exploração exclusiva do binômio borracha/castanha-do-brasil era frágil, sob o ponto de vista econômico.
Assim, depois de obterem a ampliação das áreas destinadas à atividade extrativista na Amazônia, em face da segurança fundiária conferida pelas reservas extrativistas e pelos assentamentos extrativistas, os produtores dependiam de aporte em tecnologia para ampliar sua produção florestal para além desse binômio.
 Foi justamente a perspectiva de desenvolvimento de uma tecnologia apta a atender à demanda desse tipo especial de área florestal que motivou um grupo de técnicos (a maioria engenheiros florestais) que atuavam no Acre em meados da década de 1990 a se dedicar à elaboração do que viria a ser denominado manejo florestal comunitário.
Por fim, com o surgimento das reservas extrativistas, adveio o problema da geração de renda, tendo ficado evidente que as famílias extrativistas não poderiam depender unicamente da extração de borracha e castanha.
Ocorre que o mercado gomífero tem passado por grandes transformações, apresentando uma dinâmica que tem como tendência comprovada o fato de que os seringais nativos amazônicos – nos quais a proporção média das árvores dispersas no ecossistema é de 3,2 indivíduos por hectare – estão fadados a atender a um nicho de mercado cada vez mais restrito.
Ou seja, há consenso de que a borracha oriunda do látex do seringal nativo (que pode até ser de melhor qualidade, como afirmam alguns) será cada vez mais direcionada para a manufatura de produtos bem específicos, como preservativos, torniquetes e luvas cirúrgicas. Certamente que essa produção depreca uma quantidade reduzida de matéria-prima, quando comparada à poderosa indústria de pneus, cuja demanda por borracha é atendida pelos seringais cultivados, mormente os plantados no Estado de São Paulo.
O exemplo da fábrica Natex, localizada na cidade de Xapuri, é elucidativo. Com uma produção anual estimada em 100 milhões de preservativos, essa indústria consome o látex colhido por, no máximo, 700 famílias, das mais de 2 mil residentes na Reserva Extrativista Chico Mendes. Trata-se de um número diminuto diante dos mais de 50 mil produtores extrativistas existentes no Acre.
Por ouro lado, mesmo demonstrando notável desempenho de mercado, a produção de castanha-do-brasil, isolada, não garante renda suficiente para satisfazer as necessidades de consumo dos extrativistas. E a despeito de não apresentar problemas de mercado, as árvores de castanha-do-brasil (que são difíceis de ser cultivadas) ocorrem exclusivamente no Vale do Rio Acre; essa ocorrência se acentua quando se vai em direção ao município amazonense de Boca do Acre e se dispersa quando se vai em direção a Sena Madureira, suprimindo-se totalmente após esse município.
O caminho encontrado foi a conversão do extrativista em manejador florestal. Mediante a tecnologia do manejo florestal de uso múltiplo, um leque de produtos florestais – que vão da madeira aos princípios ativos demandados pela indústria da biotecnologia – poderiam somar-se às tradicionais borracha e castanha da cesta extrativista.
Mas esse caminho, diga-se, só poderá ser traçado com um intenso processo de qualificação que permita ao produtor extrativista atuar como manejador florestal.

* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).

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