segunda-feira, 24 de junho de 2019

Preservacionismo atrapalha exploração da biodiversidade na Amazônia


* Ecio Rodrigues
Como uma sombra, o preservacionismo, considerado aqui a corrente mais radical do movimento ambientalista, por defender a utopia do meio natural intocável, contribuiu significativamente para atravancar o uso econômico da biodiversidade florestal amazônica nos últimos 30 anos.
A despeito da ausência de dados que permitam estimar com segurança os efeitos dessa influência negativa, é certo que o preservacionismo – ou, para dizer melhor, a visão preservacionista dos ambientalistas – está na raiz de uma série de barreiras que dificultam o avanço da política ambiental brasileira, e que parecem insuperáveis.
Exemplos dos impasses criados pelos preservacionistas não faltam – e pelo menos 3 deles merecem destaque: o lento e burocrático processo de formalização das concessões florestais (e, como resultado, o número irrisório de contratos celebrados); a inexistência de uma cadeia produtiva consolidada para a carne de animais silvestres; a não inclusão das florestas presentes nas unidades de conservação na frágil dinâmica econômica das cidades amazônicas.
Sob a responsabilidade do Serviço Florestal Brasileiro, a realização de leilões para a exploração de florestas nacionais pela iniciativa privada, com a posterior assinatura dos contratos de concessão, ainda não alcançou nem 10% do estoque de florestas – mesmo já passados 13 anos desde a aprovação da Lei de Gestão de Florestas Públicas (Lei 11.284/2006).
A carne de animais silvestres da Amazônia (paca, queixada, capivara etc.), produto exótico apreciado em todo o país, tem mercado garantido. Por outro lado, existe tecnologia de manejo disponível para ofertar essa proteína de forma sustentável e sob alto padrão de qualidade. Todavia, a obtenção de licenciamento para instalação de criatórios perante o Ibama e os órgãos ambientais estaduais é empreitada hercúlea, praticamente irrealizável.
Por fim, são incompreensíveis as razões pelas quais permanece na ociosidade econômica um território florestal superior a 12% da Amazônia, atualmente segregado em unidades de conservação – sendo que é indiscutível a demanda para a exploração de um amplo leque de produtos, além de serviços relacionados ao turismo ecológico.
Na verdade, chega a ser espantoso que, mesmo com a ampliação da área territorial reservada às unidades de conservação – diante da criação, nos últimos 30 anos, de 65 reservas extrativistas e a consequente destinação de mais de 13 milhões de hectares ao uso sustentável da biodiversidade na Amazônia –, a convicção preservacionista prevaleça entre os ambientalistas.
Acontece que, para os preservacionistas brasileiros, a opção pela proteção dos ecossistemas implica impedir a presença humana (ou seja, de populações tradicionais e indígenas) em unidades de conservação e, por conseguinte, o uso econômico dessas áreas.
Sem embargo, a subsistência de um contingente populacional que logrou manejar a biodiversidade ao longo de séculos de ocupação configura, decerto, a prova mais contundente de que a permanência dos extrativistas garante a manutenção do ativo florestal objeto de salvaguarda.
O que os preservacionistas parecem querer ignorar é que seringueiros, castanheiros, piaçabeiros e outros produtores florestais, com suas técnicas próprias de manejo, aprimoradas ao longo de décadas, conseguem auferir renda ao tempo em que conservam o recurso florestal sob exploração.
Está na superação da visão preservacionista utópica que permeia a atuação dos órgãos ambientais a saída para destravar a política ambiental e conter o desmatamento legalizado na Amazônia.

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

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