* Ecio Rodrigues
Como uma
sombra, o preservacionismo, considerado aqui a corrente mais radical do
movimento ambientalista, por defender a utopia do meio natural intocável, contribuiu
significativamente para atravancar o uso econômico da biodiversidade florestal amazônica
nos últimos 30 anos.
A
despeito da ausência de dados que permitam estimar com segurança os efeitos
dessa influência negativa, é certo que o preservacionismo – ou, para dizer
melhor, a visão preservacionista dos ambientalistas – está na raiz de uma série
de barreiras que dificultam o avanço da política ambiental brasileira, e que
parecem insuperáveis.
Exemplos
dos impasses criados pelos preservacionistas não faltam – e pelo menos 3 deles
merecem destaque: o lento e burocrático processo de formalização das concessões
florestais (e, como resultado, o número irrisório de contratos celebrados); a
inexistência de uma cadeia produtiva consolidada para a carne de animais
silvestres; a não inclusão das florestas presentes nas unidades de conservação na
frágil dinâmica econômica das cidades amazônicas.
Sob a
responsabilidade do Serviço Florestal Brasileiro, a realização de leilões para
a exploração de florestas nacionais pela iniciativa privada, com a posterior assinatura
dos contratos de concessão, ainda não alcançou nem 10% do estoque de florestas –
mesmo já passados 13 anos desde a aprovação da Lei de Gestão de Florestas
Públicas (Lei
11.284/2006).
A
carne de animais silvestres da Amazônia (paca, queixada, capivara etc.),
produto exótico apreciado em todo o país, tem mercado garantido. Por outro
lado, existe tecnologia de manejo disponível para ofertar essa proteína de
forma sustentável e sob alto padrão de qualidade. Todavia, a obtenção de
licenciamento para instalação de criatórios perante o Ibama e os órgãos
ambientais estaduais é empreitada hercúlea, praticamente irrealizável.
Por fim,
são incompreensíveis as razões pelas quais permanece na ociosidade econômica um
território florestal superior a 12% da Amazônia, atualmente segregado em
unidades de conservação – sendo que é indiscutível a demanda para a exploração
de um amplo leque de produtos, além de serviços relacionados ao turismo
ecológico.
Na
verdade, chega a ser espantoso que, mesmo com a ampliação da área territorial reservada
às unidades de conservação – diante da criação, nos últimos 30 anos, de 65 reservas
extrativistas e a consequente destinação de mais de 13 milhões de hectares ao
uso sustentável da biodiversidade na Amazônia –, a convicção preservacionista prevaleça
entre os ambientalistas.
Acontece
que, para os preservacionistas brasileiros, a opção pela proteção dos
ecossistemas implica impedir a presença humana (ou seja, de populações
tradicionais e indígenas) em unidades de conservação e, por conseguinte, o uso
econômico dessas áreas.
Sem
embargo, a subsistência de um contingente populacional que logrou manejar a
biodiversidade ao longo de séculos de ocupação configura, decerto, a prova mais
contundente de que a permanência dos extrativistas garante a manutenção do ativo
florestal objeto de salvaguarda.
O que
os preservacionistas parecem querer ignorar é que seringueiros, castanheiros,
piaçabeiros e outros produtores florestais, com suas técnicas próprias de
manejo, aprimoradas ao longo de décadas, conseguem auferir renda ao tempo em
que conservam o recurso florestal sob exploração.
Está na
superação da visão preservacionista utópica que permeia a atuação dos órgãos ambientais
a saída para destravar a política ambiental e conter o desmatamento legalizado na
Amazônia.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.