* Ecio Rodrigues
Parece
que as pessoas ainda não se deram conta dos efeitos decorrentes das mudanças no
clima em seu cotidiano. Aqui na Amazônia é possível que o desaparecimento da
histórica estacionalidade que sempre dividiu o ano em inverno e verão faça
finalmente a ficha cair, como se diz.
Primeiro,
é sempre bom reforçar que, na Amazônia, o desmatamento e sua ampliação anual a
taxas persistentes e superiores a 5 mil km2 está na raiz de todos os
males, em especial no que diz respeito ao aquecimento global.
Significa
afirmar, sucintamente, que duas prioridades deveriam ser assumidas pelos
gestores públicos como emergenciais: o reflorestamento das áreas já desmatadas
e a redução a zero do desmatamento a partir de 2016.
Dito
isto, cabe analisar, num despretensioso exercício de presciência, quais poderiam
ser as consequências se as duas estações climáticas regionais – denominadas de inverno
(alta pluviosidade) e verão (baixa precipitação) – viessem a se confundir, a
ponto de a distinção entre ambas não ser mais perceptível.
A
palavra-chave, aqui, é “adaptação”.
Como
se sabe, existe estreito vínculo entre o comportamento das florestas e as
estações do ano, principalmente em função das alterações na oferta de três
insumos que as plantas e animais valorizam muito: água, temperatura e luz.
Para
usar o exemplo da oferta de luz, diga-se que o fotoperíodo (como preferem os
agrônomos) é bem maior durante o verão (que corresponde ao inverno amazônico).
Durante esta estação as plantas ficam expostas à luz do sol por um tempo mais
longo; por conseguinte, observa-se ampliação da fotossíntese e da produção de
flores e frutos, o que, enfim, costuma ser bastante admirado pela fauna
silvestre.
Se não
mais houver distinção entre o inverno e o verão amazônicos, tanto os humanos quanto
a fauna e a flora terão que se adaptar às novas condições climáticas.
Muitos
haverão de considerar que a ocorrência de uma única estação climática, durante
todo o ano, pode representar maior estabilidade na vazão dos rios e encerrar o
ciclo dos traumas relacionados às alagações, como a que aconteceu em 2015.
Enganam-se.
A estabilidade na pluviosidade não significa necessariamente o fim de eventos
extremos. Ainda que a vazão dos rios se mantenha durante a maior parte do ano
em níveis médios, alagações e secas vão continuar acontecendo – uma vez que as causas
desses eventos estão vinculadas a fatores como desmatamento, quantidade de carbono
jogada na atmosfera, aquecimento do planeta e alterações no clima.
A
palavra chave, nesse caso, é “resiliência”.
Entendendo-se
resiliência como a capacidade de o rio retornar ao estágio original depois de
sofrer algum tipo de impacto ou pela ocorrência de eventos extremos, pode-se
dizer que maior ou menor resiliência representa recuperação rápida ou lenta,
respectivamente, após uma alagação ou seca.
A
resiliência está diretamente relacionada à vazão do rio e, sobretudo, à
quantidade de biomassa florestal presente na mata ciliar. Assim, a taxa de desmatamento
evidenciada em determinada bacia hidrográfica irá interferir diretamente na
resiliência dos cursos d’água que integram essa bacia.
A adaptação
ao fim do inverno e do verão demandará pesquisas sobre a resiliência dos rios e
a interação entre água e floresta. Mas isso, hoje, não passa de utopia.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável
pela Universidade de Brasília.
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