* Ecio Rodrigues
No desfile
do carnaval carioca deste ano, as duas escolas de samba que apresentaram
enredos relacionados ao meio rural confundiram o universo caipira – que em tese
se refere ao modelo de produção da agricultura familiar – com o mundo do agronegócio.
Não obstante, trata-se de duas concepções insuspeitadamente distintas e até mesmo
incompatíveis.
Para
entender melhor. A Unidos da Tijuca, ao homenagear o Mato Grosso, um dos
maiores (senão o maior) produtor nacional do agronegócio de soja e gado, cometeu
o erro de associar esse modelo produtivo à agricultura familiar, que se caracteriza,
por sua vez, pela pequena produção – aquela que, por exemplo, vende ovo caipira em feirinhas de agricultores.
A Imperatriz Leopoldinense repetiu o equívoco, ao vincular os caipiras da
pequena propriedade aos produtos do agronegócio.
Antes
de tudo, é necessário esclarecer que, no que concerne à Amazônia, ambos os modelos
se configuram insustentáveis: qualquer plantio, seja em grande escala, no caso
da soja, seja em pequena escala, no caso da maniva (mandioca) plantada pelos
pequenos agricultores amazônidas, requer o desmatamento da floresta. Sem
embargo, não há dúvida que o grau de insustentabilidade do primeiro é
incomparavelmente maior do que o do segundo.
A
diferença entre um e outro modelo pode ser constatada também em termos de
concentração de terra, uma das mazelas que travam o desenvolvimento do país. A
alta concentração de terra é comprovada pelo Coeficiente de Gini, índice que
mede a desigualdade e que, em relação à concentração fundiária, equivale a 0,82
no Brasil.
Ou
seja, muita terra na mão de poucos, pouca terra na mão de muitos. As grandes
propriedades, usadas para o agronegócio, constituem a absoluta maioria das
terras do país e se concentram nas mãos de alguns proprietários; as pequenas
propriedades, por outro lado, representam uma pequena porcentagem dessas terras,
mas se distribuem entre um grande número de produtores.
O fato
é que esse tipo de imprecisão conceitual cometido pelas duas escolas de samba é
bastante comum quando se trata do tema sustentabilidade.
E
ainda falando de carnaval, um erro mais grave do que misturar agronegócio com
produção familiar diz respeito à escolha das matérias-primas para a confecção das
fantasias e carros alegóricos. Geralmente, e indevidamente em nome da
sustentabilidade, opta-se pelo uso de plástico, dito reciclado, sem atentar
para um detalhe fundamental – essa enganosa reciclagem cria um novo uso para algo
que não deveria ter uso nenhum.
Na
verdade, o melhor caminho para reverter o impacto ambiental causado por megaeventos
como o carnaval carioca é o plantio de árvores. Todavia, para que se tenha
sucesso na empreitada, é imprescindível a definição de três pontos: o que
plantar; onde plantar; e quem vai gerenciar o plantio.
A escolha
das espécies mais indicadas para o plantio exige a expertise de um engenheiro
florestal e vai depender da resposta para a segunda questão (onde serão
realizados os plantios).
Diante
da crise hídrica atual, em que a falta ou o excesso de água tem causado
transtornos irreparáveis, a restauração florestal da mata ciliar dos rios
parece ser o propósito mais nobre para tornar o carnaval sustentável.
Por fim,
como não existe um órgão público para se confiar, o mais indicado é que
empresas e organizações sociais gerenciem os reflorestamentos.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.
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