* Ecio Rodrigues
Ao que parece, a Prefeitura de Porto Velho resolveu contratar
um borracheiro para enfeitar a cidade para o Natal. Nada contra os
borracheiros, mas convenhamos que improvisar árvores de natal com pneus não é
bem o que se espera de uma decoração natalina.
Três pressupostos deveriam pautar a tomada de
decisão de um agente público, no que concerne à decoração natalina de uma
cidade.
Antes de discutir esses pressupostos, contudo, é
preciso reforçar o que todo o mundo já sabe: que os enfeites de natal servem
para aumentar a estima da população para com a cidade, o que se reflete em
atitudes positivas em relação ao pagamento de impostos, à conservação de
equipamentos públicos, em ações, enfim, de cidadania e urbanidade.
O primeiro pressuposto para a escolha dos arranjos
natalinos é, como não poderia ser diferente, o efeito estético que a
ornamentação irá causar, considerando-se sua adequação à paisagem urbana e, o
mais importante, o que a sociedade local valoriza nessa paisagem.
Nesse quesito, as árvores de natal de pneu são
exemplo de insensatez. Expostas nos canteiros da Avenida Jorge Teixeira, uma
das principais de Porto Velho, elas destoam completamente do jardim ao redor.
Pintados de verde, numa demonstração de mau gosto, os pneus tentam imitar as árvores
reais. Por outro lado, não dá para imaginar que os habitantes daquela capital prefiram
pneus usados, em detrimento, por exemplo, das próprias plantas presentes no
jardim.
O segundo pressuposto diz respeito ao orçamento. Por
mais que muitos brasileiros sigam acreditando que os serviços públicos não têm
custos, o preço dos enfeites certamente pesa no orçamento das municipalidades
menos abastadas, levando à escolha da decoração que importe em menor gasto.
A opção pelo menor preço, evidentemente, encontra limites.
Mesmo que os custos com a compra de materiais esdrúxulos (como pneus usados) sejam
bem menores que uma ornamentação mais sofisticada, a decisão da autoridade
pública deve se basear no que os economistas chamam de custo/benefício.
Quer dizer, não adianta o baixo custo, se os benefícios
são duvidosos. De que vale uma decoração barata, se o valor estético dessa
decoração é discutível?
Finalmente, há também o pressuposto da
sustentabilidade. Numa época em que o mundo tenta encontrar caminhos para a
consolidação da denominada economia de baixo carbono, em substituição ao atual
sistema econômico baseado no petróleo, parece adequado, especialmente no caso
das cidades amazônicas, que os enfeites de natal espelhem algum grau de
preocupação com o destino da humanidade.
Ironicamente, é provável que justamente esse pressuposto
tenha sido a maior justificativa para a criação das árvores de pneus. Nada mais
equivocado. Ocorre que existe uma confusão perigosa entre o significado dos
termos “reciclagem” e “reuso”.
Sob a perspectiva da sustentabilidade, não adianta
reciclagem sem reuso, uma vez que o princípio a ser observado, necessariamente,
é o da diminuição das matérias-primas indesejáveis no meio ambiente. Para que
essa diminuição ocorra, por sua vez, a matéria-prima reciclada deve ser
transformada num produto idêntico ao original; isto é, os produtos reciclados
devem forçosamente retornar ao mesmo uso.
Se, como ocorre com as árvores de pneu e de PET, é
criado um uso novo para a matéria-prima reciclada, ao invés de diminuir, ela
irá aumentar no meio e, obviamente, nos lixões.
Enquanto decisões públicas forem tomadas com
indiferença, na Amazônia, a maior floresta tropical do mundo, as árvores de
natal serão de lixo.
* Professor da Universidade
Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e
Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e
Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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