* Ecio Rodrigues
Antes mesmo de se iniciarem as discussões
acerca da demanda por um duvidoso processo de Zoneamento Ecológico e Econômico
na Amazônia, o produtor do setor primário da economia, em especial o que
explora e processa algum tipo de matéria-prima florestal, sempre esteve
submetido às regras impostas pela regulação estatal.
O processo de zoneamento é duvidoso por ser
extremamente caro e apresentar retornos questionáveis para a sociedade. São
raros os casos em que as áreas zoneadas são destinadas à função que lhes foi
atribuída, uma vez que a dinâmica social e econômica local costuma desprezar as
conclusões advindas do zoneamento.
Mas, voltando ao tema, duas normas evidenciam
com clareza a viva interferência da regulação estatal sobre as atividades rurais.
A primeira delas restringe a conversão da floresta, ou o desmatamento, a 20% de
toda propriedade privada existente na Amazônia. A segunda, por sua vez, impede
o uso do solo e da floresta presentes nas margens dos rios, nascentes, topos de
morro e encostas.
Já às voltas com as imposições decorrentes da regulação
estatal (note-se que não foram mencionadas aqui as normas vinculadas ao
processo de licenciamento ambiental), o produtor se viu, mais recentemente, compelido
a incluir no seu rol de obrigações um conjunto de regras estabelecidas não pelo
Estado, mas pelo próprio mercado.
Sob a perspectiva do produtor, era algo bem
peculiar, que diferia profundamente do procedimento de regulação a que estava
habituado, todo especado na fiscalização estatal. Isso fez com que o produtor
desconfiasse da obrigatoriedade desses novos preceitos, sob o argumento de que
não estariam amparados por lei; esquecendo-se, nesse caso, que, justamente por
se tratar de regras impostas pelo mercado, não deprecam o resguardo legal.
No âmbito da produção florestal, o melhor
exemplo de uma exigência fixada pela regulação de mercado é a certificação do
tipo selo verde, notadamente a imposta pelo Conselho Internacional de Manejo
Florestal, conhecido pela sigla FSC.
Diga-se que, a despeito de a certificação de
produtos florestais pelo FSC ser motivada pelas forças de mercado e dispor de
ampla aceitação mundo afora, há quem a rotule como uma barreira ao acesso dos
produtores menos estruturados a mercados mais competitivos; ou seja, como um
tipo de triagem motivada não por quesitos tarifários, mas ambientais.
Todavia, independentemente da validade acadêmica
desse ponto de vista, o fato é que a certificação florestal pelo FSC pode representar,
para o produtor, o ponto decisivo para a sua permanência em determinado mercado
e a obtenção de determinada clientela.
No caso do produtor florestal, sobretudo o que
maneja florestas nativas na Amazônia, a regulação de mercado suscitada pelo FSC
nos últimos 10 anos tem se mostrado um poderoso instrumento de regulação, tirando
do mercado (ou reduzindo o mercado de) um número expressivo de empresas
florestais.
Por sinal, a relevância conferida pelo mercado
à certificação não foi prevista pelos envolvidos com o setor. Ao contrário, a
expectativa era a de que os empresários, aflitos por sanar as exigências da
regulação estatal, não se arriscariam com um novo tipo de regulação. Mas o
mercado foi levado a isso.
Essa incapacidade de prever o aumento e a consolidação
da regulação de mercado, que prescinde da atuação costumeira e sempre negociadora
do fiscal da regulação estatal, traz à tona uma característica negativa das
empresas que atuam no setor florestal da Amazônia – a falta de planejamento em
geral.
A certificação florestal é uma realidade, ou
melhor, uma tendência. É a regulação de mercado operando a favor da
sustentabilidade.
* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac),
Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e
Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em
Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).
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