* Ecio Rodrigues
Estudo recente publicado pelo Ministério do
Meio Ambiente, em associação com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação
e ainda com o Ministério da Agricultura, mapeou, por meio de imagens de
satélite, o que está acontecendo com as áreas de floresta desmatadas na
Amazônia.
A ideia é obter informações sobre as
atividades produtivas responsáveis pela pressão pelo desmatamento na região – problema
que persiste a taxas preocupantes, a despeito da redução de 18% apurada na
última medição, que abrangeu o período de agosto de 2013 a julho de 2014.
Se o resultado do levantamento, por um lado,
pode ser considerado óbvio e esperado, por outro, surpreende. O óbvio diz
respeito à constatação, visível para quem transita pelas rodovias pavimentadas
na Amazônia, de que a absoluta maior parte da área de floresta destruída se destina
à criação de boi.
Até 2012, ano final do mapeamento por
satélite, 60% do total de 751.340 km² de florestas desmatadas, equivalente a
18,5% de toda a área florestal da Amazônia, teve como propósito a implantação
da pecuária de gado; apenas 5,6% da área desmatada é ocupada pela produção
agrícola, com destaque para a cultura da soja.
Sem querer entrar na discussão sobre os eventuais
benefícios econômicos e sociais que a pecuária possa trazer para a região, o
que se observa é que nessa exorbitante área de 450,8 mil km² tomada pela
atividade os indicadores de desenvolvimento humano não são nada animadores.
Por outro lado, surpreende a revelação de que
23% da área de floresta destruída apresenta vegetação sob algum estágio de
regeneração florestal. Antes de qualquer coisa – e antes de concluir-se,
romântica e simploriamente, como fizeram as autoridades que divulgaram o
estudo, que a floresta está “voltando” –, cabe atentar para o fato de que 23%
de toda a área desmatada não tem nenhum uso.
Para entender, sob algum racionalismo (e sem romantismo),
o que acontece nesses 23% de área desmatada em que se detecta algum tipo de
regeneração florestal é preciso, na ausência de qualquer outra hipótese,
reconhecer que uma porção gigantesca de floresta foi desmatada inutilmente.
Não há razão plausível para imaginar que os proprietários
rurais, de uma hora para outra, inspirados por uma espécie de altruísmo
ecológico, tenham resolvido deixar a floresta regenerar-se em suas terras. Ou,
de outra banda, que exista algum instrumento econômico de política florestal
que torne a reconversão florestal de área desmatada uma atividade atrativa para
o produtor.
Isto é, trata-se de áreas florestais que foram
desmatadas e, depois, abandonadas. Só isso. Significa que o desmatamento foi supérfluo,
desnecessário. E que o Estado brasileiro, de forma vergonhosa, tolera que
florestas sejam em vão destruídas na Amazônia.
Por fim, há que se detalhar o estágio de
sucessão vegetal no qual se encontram os 23% de área de floresta desmatada e
abandonada.
Para encurtar a explanação técnica sobre Fitossociologia,
disciplina que tanto agrada aos biólogos e engenheiros florestais, basta dizer
que é enorme a distância – seja em termos conceituais, seja em termos de espaço
de tempo – entre um pasto abandonado (“sujo”, na linguagem dos pecuaristas) e
uma formação florestal secundária (“capoeirão”, na linguagem dos produtores).
Ou seja, a transição de um estágio pro outro
pode levar 50 anos, e inclui uma série de etapas. Sendo que o surgimento do capoeirão
nem de longe significa a volta da floresta.
Conclusão: a floresta não vai voltar por mera força
do destino. É hora de acordar, porque isso, simplesmente, não existe!
*
Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista
em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade
Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de
Brasília.