* Ecio Rodrigues
A integração
comercial entre Brasil e Bolívia vai bem além da existência e funcionamento do
gasoduto que abastece o Sudeste brasileiro com o gás boliviano.
Na
fronteira entre o Estado do Acre (Brasil) e o Departamento de Pando (Bolívia),
a dinâmica econômica todos os anos se intensifica, com o início, em dezembro,
da safra oriunda de uma árvore emblemática da Amazônia: a castanheira, ou Bertholletia excelsa.
A comercialização
do fruto dessa árvore, antes identificado como castanha-do-pará (já que até meados da década de 1980 era exportado
exclusivamente pelo porto de Belém), depois como castanha-do-brasil, e mais recentemente, devido a razões de
mercado, como castanha-da-amazônia,
representa mais da metade da renda anual dos produtores florestais que habitam ambas
as localidades.
Como
uma boa parcela da produção é vendida de um país para o outro, sempre que começa
a safra anual tem lugar a discussão que contrapõe, de um lado, as exigências impostas
a esse comércio, e de outro, a informalidade em que ele se processa.
Trata-se,
obviamente, de uma operação de exportação/importação – quer dizer, de um
procedimento administrativo-fiscal que exige muitos carimbos e, pelo menos no
caso do Brasil, o recolhimento de pesados impostos.
O
trâmite também requer o cumprimento de normas de vigilância sanitária, diante
da natureza alimentar do produto – com o agravante de que envolve séria ameaça
à saúde humana, por conta do risco de contaminação pelo fungo aflatoxina (pois grande
parte da castanha é negociada in natura,
ou seja, com casca).
Entretanto,
considerando-se que a compra e venda se dá numa região de fronteira, e que, para
consumar a transação, basta que as cargas de castanha atravessem, geralmente
por canoa, um rio estreito, com menos de 100m de largura, tanto os acreanos
quanto os bolivianos estão pouco se lixando para as formalidades.
Em
suma, é o pior dos mundos – a combinação entre excesso de burocracia e total indiferença
aos preceitos normativos. Quem perde, claro!, é a sociedade.
Em
áreas de fronteira, como se sabe, ocorre acentuada movimentação de pessoas e
produtos, e amiúde as populações vizinhas mantêm estreitas relações pessoais e
comerciais. É comum uma mesma família se dividir entre os territórios fronteiriços,
como é comum viver num país e trabalhar no outro.
O fato
é que, no caso da castanha-da-amazônia, as regras de importação e exportação que
valem para o restante do país não podem ser as mesmas para a região de fronteira
onde o produto é extraído. É evidente que essas regras devem ser
flexibilizadas.
Embora
sejam compreensíveis as preocupações do fisco e da vigilância sanitária, é questão
de bom senso o estabelecimento de condições comerciais que sejam interessantes para
os dois países.
Por
sinal, por ocasião da construção das pontes ligando os municípios acreanos de Brasileia
e Assis Brasil às cidades de Cobija e Iñapari (Bolívia e Peru, respectivamente),
havia a expectativa de que o comércio da amêndoa e as relações econômicas de
forma geral avançariam.
Todavia,
as pontes não trouxeram progresso significativo às trocas comerciais entre essas
nações, sobretudo no que diz respeito à castanha. Faltou, tanto à época quanto agora,
associar a ligação física à redução das exigências alfandegárias, elemento
essencial para melhorar o ambiente de negócios.
Espera-se,
para a safra de castanha-da-amazônia que se inicia em dezembro próximo (e que vai
até março/2019), a recuperação da produção aos patamares da média anual de 40
mil toneladas – bem superior à pífia safra de 2017, que não passou de 10 mil
toneladas.
A flexibilização
das regras de exportação da castanha-da-amazônia fomentaria a economia do Acre.
Simples assim.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de
Brasília.
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