* Ecio Rodrigues
Quando se trata de planejar uma viagem de carro
pela América do Sul, saindo do Acre, são poucas as informações disponíveis. Por
sinal, veio da dificuldade em obter alguma resposta às dúvidas mais básicas a
motivação para escrever este artigo.
Então, sem deslumbramentos, porém deixando claro
que as paisagens exóticas e exuberantes do Peru, que mesclam deserto árido, floresta
amazônica e oceano Pacífico, compensam os infortúnios, vamos lá.
Todo mundo diz que o passaporte é desnecessário
para transitar entre os países sul-americanos, o que é verdade. Entretanto, muitos
viajantes são barrados na fronteira, por não dispor do documento de identidade considerado
válido.
Carteiras de identidade profissional, como as portadas
por médicos, advogados, engenheiros, embora informem o RG e sejam documentos
oficiais, não são aceitas. Só serve a cédula expedida pelas secretarias de
segurança ou institutos de identificação.
A justificativa é que apenas esse documento é reconhecido
pelo Acordo do Mercosul. Um entendimento questionável, já que, no rol de
documentos admitidos para os brasileiros constam, além do passaporte, “Registro
de Identidade Civil” e “Cédula de Identidade”. Ora, parece certo que as
carteiras profissionais se incluem no primeiro caso. De qualquer forma, claro
que é um problema do Brasil – e de solução fácil, aliás.
Mas, antes de chegar a Iñapari, primeira cidade peruana,
é preciso vencer mais de 300 km de rodovia em estado lastimável de conservação,
ligando Rio Branco a Assis Brasil, última cidade brasileira. Você e o carro não
sabem, contudo, a coisa vai piorando de maneira assustadora e um tanto
vergonhosa.
São poucos os trechos na BR-317, a Estrada do
Pacífico, em que a pavimentação permite atingir 100 km/h. E nada se compara aos
últimos 100 km. Trafegar da cidade de Brasiléia (que nunca se recuperou da
alagação de 2012) até a fronteira peruana é arriscado de dia e impossível à
noite.
E nem se fale das condições do prédio que abriga a alfândega
brasileira, onde se realizam os procedimentos para sair do país. Mais uma vez, é
vergonhoso. Nessas horas tem-se a exata noção de nossa condição
terceiro-mundista. Sem contar que não há um espaço apropriado para o atendimento
aos cidadãos e turistas – todos são tratados sem o devido respeito, como se o
fato de estar ali nos tirasse a dignidade.
Ao chegar ao Peru, é melhor que o veículo esteja em
nome do condutor. Porém, se não for esse o caso, é necessária uma autorização
do proprietário, com firma reconhecida e apostilada (quando a assinatura do tabelião
também é reconhecida).
Mais uma dica. Embora não haja informação a
respeito em nenhum dos lados, é obrigatório, para rodar no Peru, contratar um seguro,
o “Soat”. Custa em torno de 60 soles, mas ai de quem é flagrado sem: terá que
desembolsar muito mais em propina.
Passando por Iñapari e depois de cerca de 200 Km, surge
a pequena e caótica Puerto Maldonado. A estrada em perfeitas condições é uma
agradável surpresa. Os custos de manutenção são cobertos por 4 pedágios, que
cobram 6,50 soles cada um (câmbio médio atual por lá: 1 real = 0,90 sol).
Os peruanos, como nós, não sabem definir limites de
velocidade nas rodovias – em todo o país, as placas indicam a velocidade máxima
de 60 km/h. Óbvio que não são obedecidas. A solução deles, como por cá, foi
inibir a desobediência com quebra-molas. São mais de 80 nesse trajeto, o que atrasa
bastante a viagem.
E se for continuar para Puno, prepare-se para 10
horas de vigem subindo os Andes, sem opção razoável de hospedagem ou alimentação.
Prepare-se também (com remédios e mesmo oxigênio) para enfrentar o mal-estar que
pode ser causado pela grande altitude, que alcança mais de 5.000 m (Puno fica a
quase 4.000 m).
Destoando do visual de vilas e cidades como Juliaca
(que parece uma cidade em escombros), a paisagem natural é fascinante. Imperdível,
para os aventureiros.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.
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