segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Experiência do Projeto Ciliar Só-Rio Acre completa cinco anos

* Ecio Rodrigues


 A discussão sobre as espécies que devem ser empregadas na restauração florestal das áreas de mata ciliar persiste, a despeito de o Código Florestal e a Resolução 429/2011 (do Conama) expressamente exigirem o plantio de árvores que sejam nativas e endêmicas no respectivo trecho de mata ciliar objeto de restauração. Não há espaço legal ou técnico para o plantio de árvores frutíferas e a transformação da mata ciliar num grande pomar, por uma razão simples: a produção de frutas não melhora a quantidade e a qualidade da água que flui no rio. A água é o produto ofertado pela mata ciliar, não as frutas, como querem os desavisados.

 Com reconhecimento obtido ao vencer o Prêmio Samuel Benchimol edição 2011, na categoria ambiental, o Projeto Ciliar Só-Rio Acre completa em 2015 cinco anos de execução. A sugestiva denominação “Ciliar Só-Rio” faz referência, obviamente, à mata ciliar (que, por sua vez, recebe essa designação em alusão aos cílios dos olhos) – expressando ainda a ideia de simplicidade e de alegria: basta restaurar a cobertura florestal presente na mata ciliar para que o rio Acre volte a sorrir, volte a ser um rio, com suas características ambientais restauradas. A premissa de que a restauração florestal da mata ciliar ampliaria a resiliência do rio – entendendo-se resiliência como a capacidade de o rio assimilar e reverter impactos ambientais – foi apresentada ao CNPq ainda em 2006. Em 2010, a instituição aprovou, por meio de edital, um orçamento de 200 mil reais destinados ao investimento em ações relacionadas à mata ciliar, a serem executadas nos municípios do Acre atravessados pelo rio de mesma designação. De maneira sucinta, o investimento foi direcionado para: 1. Mapear, por meio do emprego de imagens de satélite (atualizadas), uma faixa de dois quilômetros de largura em cada margem, no perímetro em que o rio corta o Estado do Acre; 2. Diagnosticar, por meio de inventário florestal, os tipos de florestas, a fitossociologia e a dinâmica da vegetação presente ao longo daquela faixa de dois quilômetros; 3. Identificar os trechos desmatados de mata ciliar considerados críticos em cada um dos oito municípios cortados pelo rio em território estadual; 4. Calcular, mediante o emprego de um indicador concebido pela equipe de pesquisadores (denominado IVI-Mata Ciliar), as 20 espécies arbóreas e de palmeiras a serem prioritariamente empregadas em futuros projetos de restauração florestal; e 5. Promover uma campanha de conscientização direcionada para a aprovação de uma Lei Municipal da Mata Ciliar, a fim de definir a chamada Largura Técnica da faixa de mata ciliar a ser obedecida em cada município. Durante os primeiros 36 meses de execução do projeto, um total de 12 pesquisadores se envolveu na medição de mais de 4.800 árvores, distribuídas na mata ciliar do rio Acre, entre Assis Brasil, nas proximidades da nascente, até bem perto da foz, em Porto Acre. O estudo dessas formações florestais possibilitou a organização de uma promissora linha de pesquisa, chamada preliminarmente de “Interação água e floresta na Amazônia”, cuja demanda por trabalhos técnicos ainda está por ser definida. Tanto a metodologia adotada pelo projeto – ancorada no tripé mapeamento por satélite, inventário da tipologia florestal e mobilização para aprovação de legislação municipal – quanto as inovações tecnológicas desenvolvidas, baseadas nas formulações matemáticas que resultaram no indicador IVI-Mata Ciliar e no cálculo da Largura Técnica da faixa de mata ciliar, possibilitaram a elaboração e o teste de procedimentos especificamente destinados a estudos sobre matas ciliares. Diante do desempenho alcançado, não há dúvida que esses procedimentos são adequados para a realidade do bioma Amazônia, sendo passíveis de ser adotados, com algumas modificações, em outras localidades. A experiência do Ciliar Só-Rio já foi reproduzida no igarapé Batista (que corta a cidade de Rio Branco), no igarapé Santa Rosa (que nasce e morre no município de Xapuri), e também no Purus, na área de influência da cabeceira desse rio. Os resultados são reveladores de uma realidade na qual a política pública pode e deve intervir. * Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

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