* Ecio Rodrigues
Ingenuidade imaginar que, por uma espécie de altruísmo ecológico, uma
decisão de política de governo, no caso, a de construir uma usina hidrelétrica,
poderia ser revista durante o processo de licenciamento ambiental da obra.
Ora, diante da máxima, válida para qualquer lugar do mundo pelos próximos
50 anos (prazo que pode ser considerado otimista para superação da crise de
energia que afeta a humanidade), de que onde houver um rio com queda suficiente
uma hidrelétrica será construída, uma coisa é certa: muitas hidrelétricas ainda
estão por vir.
E a razão é simples. Acontece que as alternativas ao aproveitamento da
força d’água para a geração de energia elétrica, ou são piores em termos
econômicos e ambientais (como a geração a diesel, a gás ou a carvão mineral),
ou não alcançam uma escala compatível com a demanda atual (como a energia eólica
ou a solar), ou, ainda, representam um risco que a humanidade não está disposta
a suportar (como a nuclear).
Por sinal, foi essa a lógica que impeliu o país a investir maciçamente na
construção de hidrelétricas em todo o território nacional, e especialmente na
Amazônia – nesse caso, em função da abundante quantidade de água ofertada pela
bacia do rio Amazonas.
Passados mais de 120 anos desde a construção da primeira hidrelétrica, e contando
atualmente com mais de 120 usinas em operação, o Brasil é uma referência
mundial na geração de energia elétrica por meio das águas; e isso vale tanto no
que se refere à tecnologia de geração quanto no que diz respeito à experiência
acumulada pela engenharia civil nacional para a construção das barragens.
Essa experiência leva as empresas brasileiras a construir usinas de
grande porte em países como China e Índia, e de pequeno e médio porte em países
como Peru e Bolívia. Uma expertise privilegiada, que deveria ser motivo de orgulho,
mas não é o que acontece.
Constata-se no âmbito da sociedade brasileira um sentimento inexplicável
de rejeição para com as hidrelétricas, e, uma vez que a desinformação
invariavelmente dá a tônica, esse sentimento acaba por ser reforçado e ampliado.
Por outro lado, como a política, ou melhor, os políticos, costumam captar
as impressões da sociedade e se esforçam para adotar o mesmo discurso,
raramente ou quase nunca uma autoridade pública se expõe na defesa das
hidrelétricas, com receio de perder votos.
As implicações da desinformação são desastrosas. A rejeição às
hidrelétricas motiva desde balburdias em que se queimam tratores e alojamentos
nos canteiros de obra das usinas até uma avalanche de ações judiciais.
Essas ações, diga-se, na maioria das vezes são propostas pelo próprio
Estado, ou seja, por procuradores públicos que de forma inexplicável desaprovam
a hidroeletricidade, uma energia considerada limpa pelos ambientalistas e pelos
países mundo afora, e se apegam ao licenciamento ambiental para tentar reverter
a construção das usinas ou, o que é ainda mais espantoso, para impedir a
operação de hidrelétricas já construídas.
Basta dizer que um levantamento realizado pela Advocacia Geral da União apontou
um total de 38 ações ajuizadas no intuito de atalhar a construção das
hidrelétricas de Belo Monte, Tapajós, Teles Pires e São Manoel, todas no Pará. Só
contra a usina de Belo Monte existem 27 ações, as quais, segundo a empresa
responsável, causaram atrasos e modificações no projeto, que, por sua vez, elevaram
o custo da obra: de R$ 19 bilhões, valor em 2010, esse custo chegou a cerca de
R$ 30 bilhões, hoje.
Não há razão para se arcar com esse ônus. É imperativo que se discuta com
a sociedade um fato: nós, brasileiros, temos muitas hidrelétricas a construir.
* Professor da Universidade Federal do Acre,
Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal
e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e
Doutor em
Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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