* Ecio Rodrigues
Nos idos dos anos 1990, a expectativa dos
envolvidos com a produção rural na Amazônia (e no Acre, em particular) era a de
que, mediante a elaboração e aprovação do Zoneamento Ecológico-Econômico, o
famoso “ZEE”, seria possível levar a efeito na região uma ocupação produtiva amoldada
aos ideais de sustentabilidade preconizados mundo afora.
Por sustentabilidade, no contexto da Amazônia, entenda-se
a exploração de recursos naturais como meio de gerar emprego e renda e, ao
mesmo tempo, garantir a manutenção do ecossistema florestal.
O caso do Acre era sintomático e exemplar, por duas
razões especiais.
A primeira, relacionada ao reconhecido processo de
organização política dos pequenos produtores extrativistas, ancorada em sindicatos
de trabalhadores e que ganhou expressão mundial na figura de Chico Mendes.
Já a segunda razão – um tanto mais complexa – diz
respeito aos obstáculos técnico-agronômicos que impedem que as terras do Acre tenham
condições de competir com outras regiões no setor da produção agropecuária.
Acontece que tanto as características fisioquímicas
do solo do Acre quanto o relevo (que impossibilitam a mecanização na maior
parte da superfície) configuram empecilhos insuperáveis para a conquista de
vantagem comparativa – em relação às terras de Rondônia, por exemplo.
Por outro lado, esperava-se que, diante da
organização do movimento dos seringueiros, seria conferida prioridade absoluta
à conservação da floresta, considerando-se inclusive que mais de 30% do
território estadual já havia sido destinado à implantação de unidades de conservação,
sobretudo na categoria de reservas extrativistas.
Sob tais circunstâncias, era natural que os pecuaristas,
representados em especial pela Federação da Agricultura, se mostrassem
relutantes em aceitar a execução do ZEE, presumindo, obviamente, que seriam
prejudicados pela redução da área destinada à produção de boi.
Por seu turno, os ambientalistas e as organizações
sociais que apoiavam os extrativistas tinham convicção de que o ZEE,
amparando-se em estudos de vocação produtiva para cada pedaço de terra, traria
como resultado o aumento da área de florestas conservadas.
Excessiva ingenuidade dos segundos, que perderam a aposta,
e também dos primeiros, que no final das contas foram beneficiados pelo ZEE.
Se havia alguma dúvida, a divulgação de dados
preliminares do censo agropecuário realizado pelo IBGE, bem como a síntese publicada
no Informativo 01 do “Fórum Permanente de Desenvolvimento do Acre”, encerrou de
vez a discussão quanto ao sucesso ou fracasso do ZEE.
Abrangendo o período compreendido entre 2006 e
2017, os dados do IBGE descortinam um momento especial da história econômica do
Acre – levando-se em conta que a Lei 1.904, que instituiu o ZEE, foi aprovada
em 2007.
Ou seja, o crescimento e a consolidação da
agropecuária nesse período, evidenciados em números que indicam a ampliação em 26%
dos estabelecimentos rurais e em 98% da área de pastagens, explicam as razões
da permanente e recorrente taxa anual de desmatamento. Fracasso do ZEE.
Também explicam o recorde de queimadas em 2016 e a
dificuldade dos gestores públicos para tomar medidas que pelo menos mitiguem o
problema, como seria o caso de uma “moratória das queimadas”. Fracasso do ZEE.
Finalmente, explicam o aumento de 340% no uso de
agrotóxico pelos pequenos, médios e grandes produtores rurais, que ampliaram seu
rebanho de gado em 22,9%. Fracasso do ZEE.
Muitos vão comemorar esses dados – o que é uma
pena, porque a verdade é que, no Acre, a realidade da pecuária não tem nenhum
futuro.
*Professor
Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista
em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
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