* Ecio Rodrigues
Relacionar o cotidiano às peripécias da política
nacional não é tarefa fácil. Poucos conseguem fazer isso e talvez esteja nessa
desconexão, entre uma ideia esdrúxula (como a que apregoa eleições diretas) e a
realidade vivenciada pela população, a explicação para boa parte das mazelas
dos brasileiros.
Estabilidade – política, econômica, social –, eis a
palavra-chave para garantir crescimento e qualidade de vida. Afinal, com
estabilidade surge o ambiente propício para debater e decidir as demandas de
Estado, e não os anseios de uns e outros que assumem o governo.
No Brasil, todavia, instabilidade, ou crise, como
prefere o pessoal da imprensa, tem sido rotina há tempos. Não à toa, em quase
30 anos desde o fim do regime militar, apenas dois presidentes concluíram seus
mandatos.
Mas, e o desmatamento, onde é que entra?
De uma análise da mais recente taxa de desmatamento
na Amazônia (divulgada no final de 2016 pelo conceituado Inpe, Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais), é possível relacionar o desmatamento à instabilidade
política e à maior crise econômica enfrentada pelo país nos últimos 100 anos.
Diante da queda na economia – PIB negativo na ordem
de 3,8% em 2015 e 3,6% em 2016 –, seria
sensato supor a retração dos investimentos.
Igualmente,
seria sensato supor a retração dos investimentos num contexto de profunda
crise política, agravada por um longo processo de impeachment, além de uma enxurrada
de denúncias que, mesmo quando não comprovadas, provocam estragos irreparáveis.
Ocorre que, na dinâmica econômica da Amazônia, investir significa
desmatar a floresta (no propósito de ampliar a área destinada à criação de boi
e não por pura maldade, como pensam os desavisados); dessa forma, acreditava-se
que a taxa de desmatamento manteria a tendência de queda, mas não foi o que
aconteceu.
A extensão da área desmatada causou um misto de
surpresa e temor em todos os que se preocupam com o futuro da maior floresta
tropical do planeta.
Surpresa, em face do inusitado aumento de 29% no
desmatamento, no período entre agosto de 2015 e julho de 2016 – ou seja, no
auge da recessão e durante o julgamento político da então presidente.
Temor, porque o aumento na destruição florestal, apesar
de ocorrer em condições políticas e econômicas atípicas, foi mais intenso nas
regiões fora do arco do desmatamento.
Segundo o Inpe, Amazonas e Acre foram os estados que
mais destruíram as florestas: respectivamente, 54% e 47% de aumento em relação
ao período anterior. Essa dinâmica pode significar o início de um novo ciclo de
desmatamento recorde, como os que ocorreram em 1995 e 2004.
Decerto haverá quem argumente que relacionar os
destinos do país à ampliação do desmatamento é pensar pequeno. Afinal, o que
representa o desmatamento da Amazônia quando o que está em jogo é a presidência?
Para os que passam seus dias pensando no Poder, o
desmatamento não significa nada, contudo, para quem se preocupa com a Amazônia,
a estabilidade é tudo, independentemente de quem esteja no poder.
Promover a instabilidade com
argumentos em favor da realização de eleições diretas, num cenário em que denúncias
são jogadas ao vento e o moralismo se sobrepõe à razão, parece até
irresponsabilidade.
Eleições vão acontecer em 2018, dentro de um cronograma
institucional que é reconhecido e esperado pela sociedade. Claro que é melhor
assim. Para a Amazônia e para o país.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.
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