domingo, 28 de setembro de 2014

Interação entre floresta e água na Estação Ecológica do Rio Acre


* Ecio Rodrigues
Não há dúvida científica acerca da estreita relação que existe entre as formações florestais e a quantidade e a qualidade da água que corre num rio.
Embora esse vínculo entre a água e a mata ciliar tenha sido desconsiderado durante as discussões que levaram à aprovação do Código Florestal, em 2012, e do decreto regulamentador do Cadastro Ambiental Rural, em 2014, os cientistas, por meio da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, não pouparam esforços para alertar que o equilíbrio hidrológico de um rio depende, em grande medida, do que ocorre na mata ciliar presente em suas margens.
O esmiuçamento desse estreito vínculo é prioridade, em especial na Amazônia. Parece claro que a região que abriga uma das maiores bacias hidrográficas e a maior formação de floresta tropical do planeta deve se aliar ao esforço científico para responder as questões que ainda instigam os pesquisadores.
Essas questões se relacionam, por exemplo, às espécies florestais que compõem as matas ciliares, e ao tipo de consórcio (entre essas espécies) mais adequado para a restauração florestal dos trechos degradados – a maior parte, diga-se, em decorrência da criação de gado.
Determinados a investigar a importância das florestas para os rios, pesquisadores vinculados à Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre lograram aprovar, no âmbito dos editais publicados pelo CNPq, dois projetos de pesquisa voltados para o estudo da mata ciliar dos rios Acre e Purus.
Os importantes resultados obtidos em ambos os projetos incluem a definição de metodologia padronizada para o inventário e mapeamento por satélite da mata ciliar dos rios que cortam o território do Acre. Também compreendem a concepção de um indicador, o denominado IVI-Mata Ciliar, que possibilita a especificação das espécies florestais a serem empregadas na restauração florestal das áreas desmatadas.
Essas experiências, por sua vez motivaram a criação do Grupo de Pesquisa Interação Água e Floresta na Amazônia. O grupo, cadastrado no CNPq, dedica-se a estudar a influência das formações florestais presentes na Estação Ecológica do Rio Acre no nível de turbidez e vazão da água que abastece os oito municípios situados à jusante da nascente do rio.
Dando continuidade às pesquisas, no período de 08 a 25 de outubro próximo, uma expedição terá lugar na estação ecológica, localizada na cabeceira do rio Acre, no município de Assis Brasil, na fronteira entre Brasil e Peru.
Contando com o apoio do ICMBio, a equipe de pesquisadores irá subir o rio, de Assis Brasil até a estação ecológica, a fim de concluir as medições iniciadas em 2012, quando a mesma expedição foi realizada no período das cheias. Agora, os níveis de vazão e turbidez do rio, além da biomassa presente na mata ciliar, serão mensurados durante a seca.
Outro objetivo da expedição será a instalação de 10 parcelas permanentes, cada uma com 20 X 130 metros. Durante os próximos 20 anos, essas parcelas serão monitoradas, visando-se a: aferir a dinâmica florestal da mata ciliar; medir o fluxo de sedimentos e de água que chega ao rio; quantificar a contribuição da estação ecológica para a qualidade e a quantidade da água que chega nos municípios à jusante; e, o mais importante, precificar o serviço ambiental que a estação ecológica presta, de melhoria na qualidade e vazão da água.
Espera-se que num futuro próximo as empresas distribuidoras de água para abastecimento urbano, as unidades de produção agropecuária e as demais indústrias que dependem da água do rio Acre paguem por esse serviço.
Os valores arrecadados irão custear o manejo da estação ecológica – que, dessa forma, poderá produzir água de melhor qualidade e em maior quantidade. Nada melhor que um ciclo econômico virtuoso.
  
* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.


domingo, 21 de setembro de 2014

TecFlorestal II - Tecnologia Florestal ao Seu Alcance



Funtac e Engenharia Florestal da Ufac
TecFlorestal II
 

A cada dois anos os engenheiros florestais da Universidade Federal do Acre e os pesquisadores da Fundação de Tecnologia do Acre, Funtac, organizam o TecFlorestal. 

Em 2012, no primeiro evento da série foi possível iniciar a discussão acerca do aproveitamento de um produto florestal especial para a realidade do ecossistema florestal no Acre: a taboca ou bambu. 

O TecFlorestal II, por sua vez, irá dar continuidade à discussão acerca do emprego da taboca na construção civil, na confecção de mobiliário e, talvez o mais importante, no manejo florestal dessa espécie.
A ideia é que o manejo florestal da taboca possibilite o fornecimento de matéria-prima, de forma permanente, para um segmento empresarial com enormes chances de consolidação no Acre. 

Ocorre que a mancha de taboca, como ficou conhecida ainda na década de 1980 a imensa porção de florestas estimada em mais de 600 mil hectares cobertas por taboca e localizadas nos municípios de Assis Brasil e Sena Madureira, foi pouco estudada tanto no que se refere ao seu manejo florestal quanto na sua aplicação.

O TecFlorestal II vai ajudar a nivelar o conhecimento sobre o bambu e a taboca e contribuir para organizar um promissor programa de pesquisas voltado a consolidação de um negócio sustentável em torno do ecossistema florestal no Acre.
Todos lá, de 22 a 26 de setembro na Ufac.
Imperdível.

domingo, 14 de setembro de 2014

Repiquete do desmatamento na Amazônia pode ser tendência




* Ecio Rodrigues
Sob um extraordinário esforço do aparato de fiscalização, o que exige um dispêndio financeiro proibitivo para as frágeis economias estaduais, certamente é possível derrubar as taxas de desmatamento na Amazônia.
Não obstante, o que mantém as taxas baixas é a política pública. Ligeira análise da curva do desmatamento na Amazônia, desde o início da medição em 1988, permite confirmar com certa facilidade essa assertiva. O ciclo de elevação e decréscimo da intensidade do desmatamento é recorrente, com recordes assustadores em 1995 e 2004, quando mais de 27.000 Km2 foram transformados (a maior parte) em pastos.
O momento atual parece ser semelhante e, ao mesmo tempo, muito preocupante. Depois que uma redução inédita foi comemorada em 2012, quando pela primeira vez o desmatamento atingiu uma área inferior a 5.000 Km2, já no ano seguinte houve um acréscimo de 29%; agora, de acordo com dados preliminares já divulgados, de agosto a julho de 2014 houve ampliação superior a 28% em relação ao aumento de 2013.
Os números demonstram que o repiquete do desmatamento nos últimos dois anos é um fato. E embora seja cedo para apontar as razões que expliquem o surgimento de um novo e trágico ciclo de destruição das florestas amazônicas, pelo menos três versões devem surgir: a dos governos, a dos ambientalistas e a dos pecuaristas.
Alguns pontos, contudo, devem ser esclarecidos.
Em primeiro lugar, as discussões que levaram à aprovação do novo Código Florestal em 2012 expuseram a fragilidade do sistema político bicameral e da relação deste com o Poder Executivo. Num vai e vem sem precedentes, o Código transitou entre o Senado e a Câmara, e entre as duas casas e a Presidência da República, sem que se solucionassem as inconsistências presentes no projeto e que permaneceram na lei aprovada.
A maior parte das polêmicas envolveu dois tipos especiais de florestas, as Reservas Legais e as Áreas de Preservação Permanente, cuja manutenção é imposta às propriedades privadas. Além de confundir conceitualmente essas duas formações florestais, o Código Florestal reduziu, de forma drástica, a quantidade de florestas que deveriam ser mantidas nas margens dos fluxos d’água.
Essa redução põe em risco a quantidade e a qualidade da água que abastece, por exemplo, os reservatórios de hidrelétricas e as áreas urbanas. Ou seja, para garantir um pouco mais de solo para a agropecuária, cometeu-se a imprudência de se desprezar a constatação científica quanto à estreita interação que existe entre água e florestas.
Por outro lado, não pode ser desconsiderado que o atual repiquete do desmatamento apresenta uma dinâmica nova e alarmante. Mais de 80% das florestas desmatadas são áreas inferiores a 20 hectares e estão localizadas em pequenas propriedades. Ao observar-se a distribuição espacial dessas áreas, nota-se que elas se afastam das rodovias, avançando sobre as margens dos rios.
Ainda não dá para saber se essa dinâmica tem ou não vinculação direta com o novo Código Florestal. Os resultados obtidos com a efetivação do Cadastro Ambiental Rural, que levou a eternidade de dois anos para ser regulamentado, poderá esclarecer essa questão no próximo ano.
O Acre surge com destaque no repiquete do desmatamento. Os municípios de Tarauacá e Cruzeiro do Sul, incluídos na lista dos que mais desmataram em julho último, são retratos da nova dinâmica, representada pela presença expressiva da pequena propriedade e do eixo dos rios. Pode ser que a contribuição do Acre nesse novo e perigoso quadro nada tenha a ver com a extinção da Secretaria de Florestas. Pode ser que tenha.
Uma coisa é certa, só uma política pública que atente para o valor da floresta manterá o desmatamento na Amazônia num nível aceitável pelo mundo. 
  
* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.